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domingo, novembro 28, 2010

Bandidos Classe A e cartas de Natal



Bandidos Classe A 
e cartas de Natal


Que filhos deixaremos para o mundo, hem? Repito a pergunta que alguém lançou na Internet e nas mentes da gente, não há muito, diante da tradicional preocupação: “Que mundo deixaremos para os nossos filhos?”. Há tempos ouço que as crianças são o futuro. Mas ao falar em futuro, parece-me, sedimentou-se a rejeição ao passado. As pessoas tendem a pensar que o passado é de dores, guerras, frustrações amorosas, erros e muitos, muitos fracassos. E as vitórias e acertos, não contam?

Erra-se muito! Mas os acertos são, na verdade, o que deve ficar. Nas citações da História, lembro-me de ter lido que um jovem e invejoso cientista visitou o gênio Thomas Edson. Atencioso, Edson mostrava tudo ao visitante e este, olhando para um volumoso caderno, quis saber:

– Mestre, e este livro?

– Ah!, - respondeu-lhe o inventor – são experiências fracassadas.

O moço, com um indisfarçável sentimento de inveja e vitória, vangloriou-se:

– Quer dizer que o senhor também erra! E se tanto erra, para que anotar tudo isso?

– Para que você, que é moço, as leia e não perca tempo repetindo-as.

Lembrei-me de tudo isso por constatar que está aí, entre os pais do momento, um erro gravíssimo: eles, que cometeram seus atrevimentos ao arrepio da autoridade dos pais, permitem que os seus filhos exerçam esse “esporte” adolescente de fazer de tudo. Repito: antes, os desatinos eram cometidos às escondidas; agora, os pais os permitem e até os estimulam – como a mãe de um dos agressores da Avenida Paulista (daquele caso dos jovens vândalos Classe A que quebraram lâmpadas fluorescentes no rosto de um estudante de jornalismo). A mãe do marginal de boutique justificou o ato do filho atribuindo à vitima uma provocação (que não houve).

Aproxima-se o Natal e, com ele, a péssima prática de incentivo desenfreado ao consumismo, uma variante de vício. Nada contra o ato de presentear, acredito mesmo que todos gostamos de presentear e de receber presentes; preocupa-me o estímulo ao “amor ao ter”, em lugar de se estimular o “ser”.

Há dois anos, e como é dos costumes, recebi um e-mail sugerindo-me ir a uma agencia dos Correios e escolher uma cartinha... Uma dessas que crianças carentes escrevem ao “bom velhinho” e enviam-na pela ECT. A empresa tem o capricho de deixá-las à disposição de quem queira presentear crianças que passam o Natal em brancas nuvens.

A Agência da Praça Cívica estava muito cheia. Uma moça da casa sugeriu-me ir a um xópin, havia postos avançados por lá. Fui ao Bougainville e achei o quiosque – uma árvore de Natal, em frente a uma loja de brinquedos, com as cartinhas dependuradas. Peguei a primeira... a segunda... a terceira... a enésima!  Saí de lá constrangido e contrariado: os petizes signatários das cartinhas só pediam brinquedos de alta tecnologia, bicicletas de muitas marchas, plei-estêichom etc. Nenhum brinquedo por menos de 150 reais!

Detalhe importante: uma cartinha era mais ou menos assim:

“Papai Noel, tenho apenas um aninho e oito meses, e  como não sei escrever pedi ao meu papai que escrevesse para o senhor. Eu quero ganhar um carrinho elétrico...” – e a carta continuava.

Esse é o pai que, daqui a alguns anos, terá um filho pichador de paredes, agressor de pederastas (se não se incluir entre os que se tornam alvos), usurpador de bens alheios, poluidor. O que deveria ser uma ação social em benefício de crianças carentes, agora é invadido pela Classe A que prefere poupar o seu e tentar “ganhar” dos desprevenidos. No mesmo alinhamento desses adolescentes agressores, podemos incluir aquela estudante de Direito (!) de São Paulo que sugeriu o extermínio de nordestinos por terem votado na Dilma Rousseff. Ou do âncora da RBS em Florianópolis, que atribui à Classe C, porque o “governo espúrio” lhes permitiu comprar carros, a culpa pelos acidentes rodoviários.

Ora... James Dean, Chico Alves, a princesa Grace Kelly, a princesa Diana, a cantora Maísa e tantos, tantos outros que morreram em acidentes de carro não foram atropeladas nem colidiram com os “Classe C” que o Lula beneficiou. Mas...



* * *


Luiz de Aquino é escritor, membro da Academia Goiana de Letras. Escreve aos domingos neste espaço. E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com.

sexta-feira, novembro 26, 2010

De flores e pichadores



De flores e pichadores




Tempo houve, no segundo governo municipal de Nion Albernaz, em que Goiânia se floriu inteira, petúnias e outras cores adornavam de amores e luzes luminosas as ruas e praças de toda a cidade!

Veio o governo petista de Darci Accorsi e mantiveram-se as flores e a beleza da cidade. Antes, na década de 1970, um cartaz afirmava que “Aqui, a Primavera tem 12 meses”. As flores da cidade murcharam-se apenas durante o retorno do PMDB, mas a proliferação dos parques e árvores compensou a mudança. Agora, com o prefeito Paulo Garcia, goianiense (há quantos anos não tínhamos um prefeito goianiense, hem?), as flores começam a reaparecer nos canteiros.

Também são muitas as praças a ganhar ornamento de jardinagem. Uma rótula na confluência da Avenida T-2 com a Avenida T-8 (essas vias merecem nomes reais, não acham?) ganhou um monturo de terra, muitos caminhões; surgiu ali uma colina e esperávamos algo surpreendente. Ficou apenas o monte nada discreto, embora pequeno, porque afronta o visual sem outros atrativos.

Em conversa com os colegas mais bem informados, soube que a praça ganhou o nome do Dr. Gilberto Jardim, neto de Veiga Valle, nosso maior santeiro. E o morrote que ali se formou seria ornamentado com esculturas de Fogaça em louvor à bossa-nova.

E então, contaram-me que as esculturas, em metal e solda, representando instrumentos musicais, foram rejeitados pelos descendentes do médico. Alegaram que ele nada tinha a ver com bossa-nova e que preferiam uma escultura de Maria Guilhermina (grande artista, também! Engrandece-nos). Uma visita ao então prefeito resultou na dispensa do trabalho de Fogaça, que acabou instado na minipraça da Avenida T-9 como a Avenida 85 (quanto número, meu Deus! Goiânia é uma tábua de logaritmos), sem qualquer explicação aos moradores e transeuntes do lugar.

Junto com “os violões”foram também instalados, ali, prismas com as placas em que 77 vultos da cidade impuseram suas mãos. O evento causou alguma estranheza... Não se via afinidade entre os instrumentos simbolizados e pessoas que não tivessem ligações com a música (agora, sabe-se a razão). E, a esse tempo, a indagação: mas aquilo é uma praça ou um simples canteiro no encontro das avenidas?

Enfim, lá estão as palmas com seus respectivos nomes e profissões, e também os “violões”. E, agora, com um triste adereço: a marca dos pichadores.

Pichadores, para mim, são marginais. Atuam na madrugada, em bandos (quadrilhas), costumam congregar filhos da Classe A com jovens sem berço, numa promiscuidade elogiável, se acontecesse em torno dos estudos, da arte ou da mera convivência harmoniosa. Só que a liga entre eles é a prática da agressão ao patrimônio, seja ele público ou privado.

Quando secretário da Segurança Pública, o senador Demóstenes Torres conseguiu limpar a cidade dos pichadores e das pichações. Por que seus sucessores não deram continuidade à repressão?


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Luiz de Aquino
Escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

quinta-feira, novembro 25, 2010

Entrevista ao programa Outra Conversa / TV Brasil Central, Goiânia

Amigos,

Aqui está a entrevista que concedi ao programa Outra Conversa, no sábado 20/11/2010, da TV Brasil Central (Goiânia):

http://vimeo.com/17105147

Aguardo seus comentários, se acharem por bem (ou por mal, tanto faz).

L.deA.

quarta-feira, novembro 24, 2010

Outra carta ao DM

Se, acaso, for necessário voltar a este tema, hei de fazê-lo sem essa conotação de protesto e indignação (esse tom nos textos estressa-me!). Havia dito que o assunto estava encerrado, mas tive de retomá-lo por conta das próprias circunstâncias e, assim, inseri informações que vão se tornando históricas. L.deA.





Homenagens inconsistentes



Em 1979, era eu repórter do semanário Cinco de Março e cobria a Câmara Municipal de Goiânia. Não era a minha única função: gostava mesmo de reportar coisas das ruas, problemas e situações urbanas, de modo que noticiar os trabalhos do legislativo municipal era um complemento às demais tarefas da semana.

Recordo-me bem do clima de festa ante a ocorrência da Anistia, seguida da “permissão”, pela ditadura (então já em agonia), para a criação de cinco partidos, substituindo o MDB e a ARENA, de triste lembrança; a ARENA (Aliança Renovadora Nacional) não renovava nada, sequer equivalia a um campo de conflito, já que o conflito era armado e nas ruas. Desde a ação mais truculenta, institucionalizada pelo general Emílio Garrastazu Médici, então no plantão da Presidência da República, a luta era armada somente do lado deles.

É incrível constatar que ainda há pessoas – e entre elas que seguram o pau da bandeira apenas por ouvir dizer, e ouvem de um só lado – que manifestam saudades do arbítrio. E mais incrível ainda é constatar que essa gente expressou seu mais legítimo apoio a José Serra, esquecendo que ele presidiu a UNE, que a UNE nunca foi da direita, que o moço presidente da UNE discursou ao lado do Presidente Jango no famoso comício da Central do Brasil que foi apontado como o estopim do golpe de 1º de Abril de 1964.

Alinham-se entre estes saudosistas da tortura gente como aquele capitão deputado – uma espécie de reencarnação do deputado (e repórter mau-caráter) Amaral Neto. E, fora do parlamento, residentes em Goiânia, os que reclamam do excesso de homenagens a Pedro Ludovico em Goiânia.

Já ouvi esse conceito (o do excesso de  homenagens) de pessoas de serviço em vários governos, desde os tempos em que atuei como jornalista da Assessoria de Imprensa da Prefeitura de Goiânia, na década de 1980, até os que há pouquíssimas semanas insistiam que a estátua de Pedro Ludovico estava muito bem nas costas da praça que leva seu nome.

Pergunto, fazendo coro a uma jovem com quem conversei sobre isso, se é digno aplicar-se uma comenda nas costas do homenageado. A moça respondeu-me que não, que lugar de medalha é no peito. E riu-se da analogia por mim sugerida entre o tórax humano e a praça.

Vá lá: de fato, são muitas as homenagens a Pedro Ludovico em Goiânia. Uma delas é uma avenida que começa no Setor Sudoeste e vai terminar no ponto em que a avenida (nesse trecho, com quatro pistas, sendo duas centrais e duas laterais) passa do domínio do Município para o do Dnit – a BR-060, trecho Goiânia-Guapó.

Tinha o Estádio Olímpico, que se chamava Pedro Ludovico (e o nome sumiu); tinha o Parque Agropecuário, que também era Pedro Ludovico (e de novo o nome sumiu). E naquele 1979, na Câmara Municipal, o nosso querido primeiro prefeito, Professor Venerando de Freitas Borges, pelejou com todas as palavras e premissas Possíveis para demover os dezessete vereadores (sim, eram só 17, mas hoje são 35; o quantitativo dos táxis, porém, continua o mesmo). Contou o velho mestre e político que Dr. Pedro não gostaria de ter seu nome na Praça, pois já demovera o arquiteto projetista da cidade, Atílio Correia Lima, de apor seu nome na principal avenida da cidade; o próprio interventor teria sacado sua caneta, riscado o nome “Avenida Pedro Ludovico” e, com uma frase definitiva, impôs o nome que perdura:

– Vamos homenagear minha cidade.

E escreveu na planta “Avenida Goiás”.

De nada adiantou: a edilidade goianiense forçou a barra. Nós, os jornalistas que a tudo assistimos, tentamos, por nossas notas, levá-los a rejeitar a proposta e acatar o que dizia o Professor Venerando. Pedro falecera em agosto e naquele final de ano a Praça Cívica recebeu seu nome, enquanto a Rua 26, a do endereço do fundador, ganhava o nome de sua mulher: Avenida Dona Gercina.

Após o incêndio no Centro Administrativo, o governador Marconi Perillo, ao reinaugurar o prédio começado por Mauro Borges e concluído por Leonino Caiado, pôs nele o nome de Pedro Ludovico.

Então, são três as homenagens ao fundador: uma praça, um palácio administrativo e uma avenida.

Sobre o Palácio, devo dizer que algumas fotos o enfeitam, no térreo. E em torno das fotos, um texto ufanista, bem na medida do necessário, porém cheio de erros de datas. Certa vez, nos últimos meses do governo de Marconi Perillo, mostrei ao coronel PM que administrava o edifício aqueles erros; marquei-os e passei-lhe às mãos, sugerindo as correções. Fui chamado por um auxiliar direto do governador que me “explicou”:

– Não vamos corrigir, por enquanto, porque o arquiteto Fulano vai se sentir ofendido.

Ah, é?! As tais “razões de Estado”, muitas vezes, não têm qualquer razão... E, assim, o erro ficou lá. Ainda está, confiram! Dentre outros, diz (o texto) que a construção teve início em 1965, no governo Mauro Borges. Ora, cheguei a Goiânia em agosto de 1963 e subi três lances de escadas para ver uma exposição de fotos da história da jovem cidade. E Mauro Borges foi deposto pelo Marechal Castelo Branco em novembro de 1964. Logo...

Quanto à avenida, devo dizer que ela começa justamente entre os setores Sol Nascente, Sudoeste e Conjunto Romildo Amaral; segue em direção à Cidade Jardim, vira à esquerda e bate no paredão do sobrado que contém as salas de aulas do Centro Universitário Anhanguera. Além das faculdades, também o SESC e o SESI obstruem o que seria o leito da Avenida, que ressurge com esse nome na Vila Canaã, naquele ponto de comércio de ferro-velho.

Finalmente, a Praça Cívica; o povo, trinta anos após a Câmara sacralizar o nome de Pedro Ludovico, continua dizendo Praça Cívica.

O tal de Monumento às Três Raças, em que pese o talento de Neusa Morais (impecável em sua arte), foi encomendado justamente para que de lá se removesse o obelisco – foi uma das primeiras agressões do Poder ao fundador. Hoje, parte dos moradores da cidade acham aquele monumento mais importante até do que a memória de Pedro Ludovico.

O interessante de se notar é que, em 1979, os dezessete vereadores teimaram, forçaram a barra – na melhor das intenções, é bom que se diga – para homenagear o fundador com a Praça do Governo. Hoje, apenas um dos trinta e cinco vereadores preocupa-se em que não se menospreze o ídolo.

– Ah, mas é homenagem demais!

A frase do então secretário ainda me dói nos tímpanos. Ele, o então secretário, sabe bem que, em Cuba, uma figura dos tempos da independência é multi-homenageado, também. Refiro-me ao jovem poeta José Martí, que lá é nome de rodovia, avenida, escolas, aeroporto e mais um não sei quantas coisas. José Martí morreu em combate aos vinte e oito anos!

No Brasil inteiro, toda corrutela tem uma rua, ou avenida, ou escola com o nome de Presidente Vargas. Ou de Rui Barbosa – notável pelo domínio da Língua e do Direito, discutível no proceder político. Aliás, os adeptos do “politicamente correto” precisam conhecer um pouco mais desse homem. Ele mandou incinerar o arquivo relativo à escravidão, alegando ser indispensável “apagar da memória” aquele mancha. Anos depois, em discurso no Senado, após ser derrotado pelo Marechal Hermes da Fonseca na disputa pela Presidência, acusou o vitorioso rival de tolerar, nos jardins do palácio, o “bodum das senzalas”, referindo-se ao grupo de dança da musicista Chiquinha Gonzaga (obviamente formado por negros).

Enquanto isso, Goiás peca por não homenagear Juscelino Kubitschek, o presidente que interiorizou o Brasil. Peca também por permitir que generais truculentos, mandantes de perseguições e assassínios, sejam nomes de escolas, pontes, ruas... Peca ao inserir em seus endereços nomes de barões e marqueses – Goiás não teve entre seus filhos ninguém agraciado com as honrarias do Império senão quando aqui já chegavam com seus títulos.

Felizmente, a malfadada inauguração do dia 18 passado não aconteceu. As carpideiras do efeito das urnas lamuriam pelos cantos, repudiam os descendentes do fundador, atribuem a Mauro Borges uma carta que dizem ter sido assinada por ele (é possível; mas certamente não foi redigida por ele e conseguiram envolvê-lo em intenções não muito bem explicadas), carta essa em que o ex-governador, filho de Pedro, indicava a Serrinha como local para se instalar a estátua.

Agora, é conseguir do próximo governo a sonhada edificação de um Memorial do Pioneiro. José Mendonça Teles, que realizou ampla homenagem aos primeiros habitantes da cidade, tem esses nomes. As famílias estão aí para colaborar, fornecendo dados e material (documentos, fotografias etc.). E certamente não faltarão quando se fizer a festa de entrega da obra ao povo, e junto com ela a fixação da estátua em lugar de honra. No meio da praça. Feito uma medalha no meio do peito.

Luiz de Aquino
Escritor, membro da Academia Goiana de Letras.



segunda-feira, novembro 22, 2010

Ainda a estátua... (espero que seja a última carta ao DM sobre o tema)


Os chupins da cultura


Senhor Editor,

A estação das águas demora-se pelo tempo, não define de vez sua presença definida de raios e ventos, trovões e cheias... Sobretudo nesta cidade de infra-estrutura sempre questionável e obras que dão boa aparência sem a existência da base firme. O resultado é céu azul de alvas nuvens poéticas – mas é poesia da Natureza, apenas. Nas ruas, há árvores e flores em profusão, para alegria dos viventes e encanto dos visitantes.

Os viventes de Goiânia são nativos filhos de migrantes interioranos; ou filhos de adventícios de outros estados e nações. Hoje, temos uma grande parcela de jovens investidores em agronegócios e coisas da vida academia, bem como de ofícios de serviços variados e indispensável. Somos uma babel de costumes e todos nós, jornalistas, sabemos que as enquetes com o populacho sobre datas cívicas nacionais ocasionam respostas engraçadas – não fossem ridículas.

E quanto às figuras da nossa pequenina história? A cidade festejou, há menos de um mês, 77 anos do lançamento da Pedra Fundamental, que, segundo os mais velhos que eu dotados de boa memória, encontra-se sob a cruz de pedra que um prefeito udenista, no princípio dos anos de 1970, removeu de seu pedestal. Aquela cruz, no meio da Praça do Cruzeiro (também conhecida como Germano Roriz), marca o local onde seria construída a Catedral Metropolitana, mas um legado do Cônego Trindade (uma quadra na Rua 10, entre a Rua 19 e a Rua 20) ensejou a nova localização, mais central.

Em Goiânia, de tantos sotaques exóticos a somar-se aos nossos interioranos, forma-se uma nova cultura que, nas próximas décadas, mostrará suas origens e a ação das raízes deste Planalto Central de flores e cerrado. No corre-corre da remontagem das coisas, na busca por se consolidar a nossa cara ante o Brasil e o Mundo, há muita coisa fora de lugar. Mas tudo o que aqui acontece repete um Brasil de acertos e muitos erros.

Um dos erros que nos envergonham: o fato de se repetir aqui o mal-feito de todas as torcidas organizadas. Em Curitiba, ano passado, a torcida conduziu à interdição do estádio do coxa-branca; aqui, a torcida do Goiás Esporte tenta fazer o mesmo, ao agredir o trio de arbitragem e o técnico Luiz Felipe Scolari, forçando a barra para que seu próprio time perca o privilégio de ter o Serra Dourada como seu estádio de mando.

E assim como acontece no meio esportivo, no segmento das coisas das artes também ocorre aquilo de “um jabuti no alto do pau”. Foi assim quando o governador Alcides Rodrigues dispensou Nasr Chaul para entronizar Linda Monteiro; com ela, vieram outros ovos de aves estranhas, e essas caras são notáveis nas páginas do DM desta sexta-feira em que o jornal nos dá conta da não inauguração da estátua eqüestre do maior vulto de Goiás em todos os tempos.

Vivo em Goiânia desde 1963 (sou filho de Caldas Novas, mas vim do Rio de Janeiro para Goiânia, empurrado por uma pneumonia renitente). Aqui, é inevitável acompanharmos o andamento dos políticos. Vi muitas ações e atitudes como fruto de um esforço para apagar o nome e a memória de Pedro Ludovico – essa, a da estátua, foi apenas mais uma. O que os estranhos no ninho não percebem é que, ao tempo em que alguns ativistas do meio cultural buscam agir de modo a lustrar sempre seus pobres umbigos, como isso de se instalar a estátua à vista do quarto de dormir de um escriba, há também os que discordam do esforço em benefício próprio – e estes estão sempre de atalaia; e outros virão com o mesmo espírito de vigilância.

Estendo minhas mãos e meus braços a todos os que se manifestaram neste esforço de resgate da dignidade. Não existe isso de se jogar a culpa no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – a  posição da equipe de Salma Saddi, na Regional do Iphan em Goiás, foi bem clara. Não podemos admitir que Pedro Ludovico Teixeira seja visto de modo menor que o Monumento às Três Raças (até esse nome é errôneo; em se tratando do bicho sapiens, somos apenas uma raça, não existe isso de branco, índio e preto).

Festejemos, pois, a decisão que restaura a dignidade do fundador de Goiânia, em sua memória. Aguardemos as ações do governo que se empossa no limiar de 2011 para apagarmos e mancha que o time do primeiro andar do Palácio Pedro Ludovico tentou impor às nossa goelas.


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Luiz de Aquino
Escritor, membro da Academia Goiana de Letras

sexta-feira, novembro 19, 2010

Ego feliz


Ego feliz



Este é um texto de saudade. Saudade só, não: é um texto de saudade, de presença e de compromisso com o amanhã, caso esse futuro tenha planos para mim. É que, caso o tenha, sei que é do meu dever retribuir. Ih, parece que ficou confuso! É assim: junto com essa saborosa obrigação de agradecer a Deus pelo novo dia que nasce, bem como render graças também no momento do sono, é preciso responder à chamada do tempo, feito aluno no grupo escolar ou soldado na formatura matinal.

Sendo assim, basta que haja um novo dia para que eu renove compromissos. E nesta sexta-feira em meados de novembro, encontro entre as mensagens do correio eletrônico duas informações: a primeira, de Adriano Curado, confrade na Academia Pirenopolina, dando notícias de seu novo blog, uma verdadeira confissão de amor à terra de Mestre Propício e de Jarbas Jaime: http://cidadedepirenopolis.blogspot.com/.

Adriano enfatiza a nossa Academia, recorda os tempos de sua fundação, conta das primeiras reuniões e do brasão. E, agora, traz-nos uma página especial sobre o artista plástico Pérsio Forzani (que, no ano que vem, festejará conosco seu 80º aniversário) e me presenteia com a publicação de um poema da minha lavra em louvor de Pérsio. Beijos procês dois, meus confrades e amigos!

O outro e-mail, postado poucos minutos após o de Adriano Curado, vem da escritora Clara Dawn, talentosa confreira nas páginas do DM com suas crônicas que nos deixam com uma vontade enorme de ler um romance de sua autoria. Clara publicou, no site da União Brasileira de Escritores de Goiás (a nossa UBE), uma crônica que escrevi justamente sobre Pirenópolis, suas ruas, seu luar e as memoráveis serenatas que foram e ainda são sal e pimenta nos meus textos, no meu coração: http://www.ubebr.com.br/post/cronica/luar-sobre-ruas-tortas-por-luis-de-aquino.

Agora, um pedido de desculpas aos colegas do DMRevista: estou com um atraso de vinte e quatro horas no envio da minha colaboração para este domingo. Foi intencional, escrevi muito estes dias (gastei muito espaço da página de Opinião do Leitor) mas os assuntos avolumaram-se na minha cabeça, quero dizer, estou com muitas opções para a crônica de hoje, mas esses dois eventos alegraram-me o coração.

Atualmente, e sobretudo após ser presenteado com o título de Cidadão Pirenopolino, meu envolvimento com a terra natal do meu pai tem sido mais próximo do que sempre; e no tocante à minha cidade-lar, Goiânia (desde 1963), também ando mais imbuído dela: ganhei título honorífico de Cidadão Goianiense e com uma feliz coincidência: os dois diplomas foram emitidos em datas imediatamente subseqüentes ao meu aniversário (o primeiro em 17/09/2009 e o segundo em 16/09/2010; sou de 15).

Bem, os leitores que me perdoem por esta ostensiva visita ao próprio umbigo. A gente gosta de ser lembrado, homenageado, paparicado... Como me fizeram os amigos Iuri Godinho, Euler Belém e Vassil Oliveira, convidando-me para uma entrevista no programa Outra Conversa (da TBC, canal 13 da tevê aberta em Goiânia), gravado na quinta-feira para veiculação às 21h30min de sábado, 20 de novembro.

Agora, chega! Já lambi meu próprio ego, mas o propósito não é exatamente mostrar-me, nem me considerar melhor que os outros. Quero mesmo é agradecer à Clara, ao Adriano, ao trio Iúri, Euler e Vassil... Ah! O Vassil começou a me fazer feliz ao apresentar-me, disse que eu era “esse belo poeta”... Levei ao pé da letra, mas ele esfriou meu entusiasmo ao esclarecer que não aplica a palavra belo à minha condição física, mas ao meu trabalho de “ativista da poesia”.

Enfim, esta foi uma bela semana! Lutas (vide as páginas de Opinião deste jornal de segunda a quarta-feira, ou o meu blog http://poetaluizdeaquino.blogspot.com), contatos e produção (produzi dois poemas novos que agradaram aos poucos amigos a quem os mostrei; mas amigos, sei não, sempre nos vêem de modo melhor, não é? ), tive o realce nos espaços virtuais acima citados e ainda fui destaque na tevê.

É muita amabilidade para um pobre marquês sem brasão... hehehe.


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Luiz de Aquino, jornalista e  escritor, é membro da Academia Goiana de Letras. E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com

quarta-feira, novembro 17, 2010

A estátua, ainda...

Mais uma carta, publicada hoje - http://www.dmdigital.com.br/index.php?edicao=8407&contpag=1 -. A inauguração do monumento é prevista para amanhã; sendo assim, reservo ainda alguns temperos para a próxima edição do DM.
Vejam a esta:




Equívocos ou má-intenção?

Além das várias antenas, a Serrinha está cercada de grandes edifícios, o que tornaria a estátua invisível. Onde colocá-la? No topo da torre de concreto? Seu lugar é a Praça de Pedro, mas sem a timidez das cercanias.


Senhor Editor, volto a pleitear espaço e não trago tema novo. É, sim, para continuar a catilinária sobre o descaso que o maior órgão oficial de cultura do Estado, a Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico, dispensa ao homem que, além de idealizar e construir esta cidade, empresta seu nome ao próprio órgão (já disse isso, em carta anterior). E por conta da carta de ontem que volto: acordei um tanto tarde, embalado pela chuva benfazeja, por conta do telefonema do escritor José Mendonça Teles.
“Vocês estão cometendo uma injustiça com o José Mendonça Teles”, disse-me ele, emocionado (costuma referir-se a si mesmo na terceira pessoa); lembrei-me que a injustiça não partiu de mim, pois até transcrevi o texto da crônica de Bariani Ortêncio em O Popular de domingo, 14.
“Pois é”, continuou ele, “eu dei a ideia e agora todo mundo é pai do cavalo”, metaforizou ele, com a cabida ironia. “Convidaram-me para ir lá ver o local, tiraram uma foto em que eu apareço e então vieram com essa história de comissão; essa comissão não existe”, definiu ele. Resumindo a pantomima: não existe, então, essa “comissão” formada por ele, José, e mais Ubirajara Galli e Bariani Ortêncio. Mas foi Bariani quem a citou e Galli silenciou-se, pelo menos até ontem, sobre o assunto.
Historiando: partiu de José Mendonça, no comecinho da década de 1990, a sugestão da estátua equestre de Pedro Ludovico, a ser colocada na Serrinha, evocando o momento em que, a cavalo e ostentando roupa própria de montaria e um solene chapéu de feltro, Pedro vislumbrou a campina. “A Serrinha, quando eu apresentei a proposta, suportaria bem um parque e a estátua, mas instalaram lá tantas antenas que o local se tornou inviável”, disse-me ele. E continuou: “Lutei por todos estes anos para ver a estátua finalizada; Neusinha (Neusa Morais) não merecia passar por tudo o que passou e morreu sem ver seu trabalho finalizado”.
José Mendonça é enfático ao isolar-se do entrevero sobre o local. Ele diz que quer ver essa estátua em lugar de distinção, em ponto digno da grandeza do homenageado, e não “num canto de praça”.
Das entrelinhas, mais me convenço de que a localização é, realmente, um capricho pessoal de Bariani, que quer mostrar, de sua sacada, poder de influência ao estabelecer aquele inaceitável ponto de sua própria paisagem.
Existem, em Goiânia, uma leva de arquitetos e urbanistas que  não foram consultados – e isso indica que houve um capricho da parte do profissional que detalhou a instalação: ou ele aquiesceu às exigências do escritor ou cumpriu cegamente ordens de sua chefe; esta, com tal atitude, passou a pá de cal no conceito de que desfruta da classe intelectual local (é intelectual quem trabalha com o intelecto, o que falta até mesmo em solenes personalidades que ostentam títulos afins).
Entre os arquitetos, Renato Rocha define bem o espaço histórico de Goiânia. E ao ouvi-lo, repercute na memória a frase costumeira da imprensa, por suas várias mídias, que a todo 24 de Outubro lembra que a cidade foi projetada para cinquenta mil habitantes. Rocha destaca que um monumento histórico, aqui, há de enquadrar nos limites do centro histórico, ou seja, a urbe projetada por Atílio Correia Lima. Fora dele, perde-se o sentido, pois a área expandida para além desses limites é o que temos, entendo eu, como “cidade nova” – no nosso caso, equivale à adição de vários anexos mal planejados, com desencontros de vias e seu conseqüente estrangulamento, exigindo complicados arranjos, por exemplo, da engenharia de tráfego.
Acho pertinente José Mendonça Teles reagir, demonstrar seu estranhamento e até mesmo mágoa, se for o caso, por usarem indevidamente seu nome e sua pessoa.
Passa da hora de se dar nomes aos bois. A goianidade agradece.

Luiz de Aquino
Escritor, membro da Academia Goiana de Letras



segunda-feira, novembro 15, 2010

Duas cartas para o jornal

Ambas em torno da questão da estátua de Pedro Ludovico, fundador de Goiânia. 
A primeira foi veiculada segunda-feira, 15 de novembro, no Diário da Manhã; a outra, terça-feira, 16 no mesmo espaço (Opinião do Leitor, pág. 5).


A PRIMEIRA
(publicada hoje, 15/11, em http://www.dmdigital.com.br/index.php?edicao=8405&contpag=1):


Goela abaixo: nunca mais!

Por que razão a Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico Teixeira teima em plantar a estátua do fundador de Goiânia no quintal do Palácio? Pelo que se sabe, a concepção da homenagem obedece a um plano que previu que a mesma ficaria na Praça Cívica, com a evidência que merece o maior de todos os nomes da história de Goiás.
Já escrevi, em várias crônicas e outras matérias jornalísticas, que existe um espírito-de-porco que tem por meta denegrir ou reduzir a importância de Pedro Ludovico Teixeira Álvares na vida política, administrativa, econômica e social de Goiás. Como não encontram manchas na vida do homem, tentam agora diminuir sua importância.
Transformem o esdrúxulo barracão que serviu de sede para a Prefeitura de Goiânia, demolindo-o e instalando-se ali um Memorial da Cidade, com a estátua em lugar de honra, como merece a memória de Pedro.
Fala-se de uma comissão, constituída de escritores, que participou da escolha do malfadado local, na Rua Oitenta e Dois, em frente à esquina com a Rua Oitenta e Cinco, no quintal do Palácio, lugar onde, como disse o deputado Carlos Leréia, os “coronéis” de antes amarravam as montarias. Diz-se que o local foi imposto pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que não permite uma estátua eqüestre no conjunto “art déco” da Praça – mas o IPHAN permitiu ou permite a desfiguração do prédio do Correio?  E permitiu ou permite o “Três Raças”?
De tanto que se tem falado nisso, veio à tona uma ponta que parece verdadeira: o que há mesmo, envolvendo o IPHAN (não consegui saber da diretora Salma Saddi se é verdadeira a informação), é que a presidente da AGEPEL (a agência que leva o nome de Pedro Ludovico) impôs a localização e a atribui ao órgão federal.
O que se comenta ainda – não posso confirmar a veracidade – é que os escritores membros da tal comissão disseram amém à presidente da AGEPEL, acatando sem contra-argumentar, a escolha feita. E comenta-se mais. Aliás, questiona-se: o que levou a atual presidente da AGEPEL a impor-se no cargo? Tinha-se por certo que Nasr Chaul continuaria presidente por todo o governo Alcides Rodrigues, mas de repente o noticiário deu conta de que a secretária da Cidadania entregou o cargo, a chave do carro funcional e o telefone celular oficial, mas exigiu, na condição de presidente de partido da base, a cadeira da Cultura.
Para o meio, e me refiro à maioria dos militantes culturais do Estado, a troca não foi agradável. Goiás tem dois nomes fortíssimos na gestão cultural, nomes que se firmam por suas ações – Nasr Chaul e Kleber Adorno. Um “estranho no ninho” não foi de bom aceite.
Por outro lado, questiona-se, há anos, a simpatia de que desfruta a sra. presidente: ela consegue, ao contrário de inúmeros (e muito competentes) colaboradores, estar bem com todos os governos. Continuará com o próximo? Ou já se ajeitou na esfera federal, ou mesmo na municipal?
Não preciso enumerar segmentos dentro do meio cultural de Goiás para demonstrar o valor dos nossos artistas; ainda que o Estado seja apenas 3,5% do concerto nacional, nossas ações culturais nada devem aos demais pólos de cultura do país. E a atual presidente da AGEPEL não contribuiu com nada para essa valorização.
No turbulento ano de 1968, na Universidade Católica de Goiás, aprendi, de tanto ouvir e constatar, que autoridade é conhecimento. Acho que essa frase não ecoava na mente de alguns alunos, pois, sabendo que os professores da UCG eram os mesmos da Universidade Federal, os alunos “de lá” deviam, também, ter ouvido a prédica.
Pela imprensa,  lemos que autoridade é quem obteve votos, ou se fez investir do poder de mando e (ou) decisão pelo legítimo caminho do concurso; ou ainda pela caneta poderosa dos que, temporariamente, ocupam tronos; por serem os anos da ditadura, aqueles desde 1964, vimos acontecer arbítrios que atentaram contra a liberdade, a dignidade e até mesmo contra a vida.
Daqueles tempos, algumas vítimas (ou a gente imaginava vítimas algumas pessoas) trocaram de lado e começaram a se sentir tão ou mais poderosas que os de fardas e estrelas. Sim: há pessoas, entre os perseguidos daqueles tempos, que não poderiam mesmo, em regime de exceção, exercer cargos públicos, pois, mesmo em tempos de liberdade -  esta liberdade que nos permite até xingar o Presidente da República – cometem arbítrios como se tudo pudessem. E querem nos forçar a engolir suas decisões arbitrárias, truculentas e inoportunas.
A gente nao quer mais, sra. presidente! Nossas goelas já engoliram o que não era de bom gosto; agora, podemos dizer não.

Luiz de Aquino
Escritor, membro da Academia Goiana de Letras.





A SEGUNDA
(http://www.dmdigital.com.br/index.php?edicao=8406&contpag=1):




Ainda regurgito

Alguém me escreve, via Net, para contestar-me: diz que centralizei na pessoa da presidente da Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico a responsabilidade pela escolha do malfadado ponto onde se instala a estátua do fundador de Goiânia e patrono da Agência de Cultura por ela presidida.
A pessoa esclarece-me que a presidente “apenas” acolheu a sugestão do escritor Bariani Ortêncio: “Ele ligava várias vezes por dia, insistindo na localização da estátua; depois, várias pessoas passaram a telefonar também, e os funcionários deduziram que eram orientados pelo escritor, que mora a poucos metros da Agepel (que funciona no primeiro andar do Centro Administrativo) e mais próximo ainda do ponto escolhido para o monumento”.
Quis duvidar. Mas, aí, vejo a crônica de Bariani em “O Popular” de 14/11/2010. No segundo parágrafo, ele declara (ou confessa): “A escolha do local, aprovado pela Agepel, foi tomada mediante consulta aos historiadores José Mendonça Teles, Ubirajara Galli e eu”.
Os três são membros do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, entidade que congrega notáveis escritores locais, poucos deles geógrafos ou historiadores de fato e de direito. Ali chegaram por questão de honraria, imagino eu. Mas em Goiás as pessoas se apossam de títulos honoríficos a bem-prazer; só não se pode se dizer médico, pois o Conselho Regional de Medicina, vigilante, processa o tal por charlatanismo, no que faz bem.
O IHGG fica bem em frente ao local onde se pretende pôr, para tristeza da família, de Pedro Ludovico, a estátua equestre. O tema, além de ocupar grandes espaços de opinião na imprensa, é assunto obrigatório entre os que se ocupam da história e do urbanismo locais. Na última sexta-feira, na calçada do Grande Hotel, desviei a atenção da boa música do evento para dar atenção a amigos e conhecidos que querem entender melhor essa decisão um tanto falaciosa.
As pessoas querem o fundador em lugar de honra; não é por estar em casa que a dignidade pode ser colocada no quarto de despejo. A sala de visitas é a Praça, em seus pontos solenes. Há pouco mais de quarenta anos, removeram o obelisco para instalar o Monumento às Três Raças (também obra de Neusa Morais). A Praça Cívica, que também leva o nome do fundador de Goiânia (apesar dos protestos de seu mais expressivo amigo, o Prof. Venerando de Freitas Borges), é a sala de visitas da cidade. Essa praça é espaço do Estado, e não da municipalidade – informação essa que escapou a descuidados vereadores que legislaram sobre terreno alheio. Cabe ao Governo do Estado decidir sobre ela e sobre isso já se pronunciou o governador eleito, Marconi Perillo.
No apagar das luzes, será de destacada grandeza a atitude do governador Alcides Rodrigues no sentido de adiar a finalização deste caso. Fala-se muito no custo da estátua – custo esse que, é óbvio, tornou-se maior diante das incontáveis protelações. Por um tempo, houve a total omissão do prefeito (1993/1996), depois a transferência do encargo para o Governo Estadual (na gestão do prefeito Nion Albernaz). As delongas magoaram profundamente a escultora, fui testemunha disso.
Logo após a morte de Neusa Morais, dediquei-lhe algumas crônicas e numa delas sugeri uma estátua em sua homenagem – nenhum escultor local, nenhum artista plástico, nenhuma autoridade política ou cultural respondeu-me; agora, são dezenas os que a usam para acusar as autoridades pela demora.
Na esteira dessas protelações, vem a ocasião: quem nomeou a tal comissão de Bariani, Bira e José Mendonça? E porque os outros dois membros da Comissão concordaram com a escolha de Bariani, que agora tem o privilégio de acordar e olhar para a estátua?
Porque essa comissão, em lugar de escolher lugar tão mesquinho para o monumento, não propõe às autoridades um conjunto de estátuas para ornamentar um jardim das artes na cidade? Teríamos lá Leodegária de Jesus , José Décio Filho, Frei Confaloni, Bernardo Élis, Eli Brasiliense, Léo Lince, Otavinho Arantes, Cici Pinheiro, José Godoy Garcia, Basileu Toledo França, João Bênio, Maestro Jean Douliez, Joaquim Edson Camargo, Belkiss Spenziere, D. J. Oliveira, Dinéia Dutra e tantos, tantos mais como numa festiva calçada de bem-estar e poesia, música e teatro, cinema e formas e cores...
Vá lá – e para dar crédito à pessoa que me contou o fato (confirmado de próprio punho por Bariani em sua citada crônica de domingo) – que a presidente da Agepel tenha apenas acatado uma sugestão. “Ela achou que, acatando a propositura, ficaria simpática aos olhos do meio cultural, onde não desfruta de boa acolhida”. Mas os propositores dessa coisa têm boa acolhida em seu próprio meio? Se provocar, é possível que  obtenham no mínimo um desagravo do IHGG, da Academia Goiana de Letras ou ainda da União Brasileira de Escritores (o corporativismo é forte, minha gente!). Mas não se trata, aqui, de execrar pessoas ou louvá-las, pois ambas as decisões seriam injustas e pessoais. Importante é reconduzir o comportamento para o bem-estar geral, em lugar de fomentar o fogo das vaidades.
Goiânia e Goiás muito receberam das penas de Bariani Ortêncio, José Mendonça Teles e Ubirajara Galli, não serei eu quem os recomenda nem os contesta  - seus escritos, em livros e jornais, estão aí para os atuais e a posteridade. Entretanto, compete-lhes mais: agir de conformidade com seu compromisso ante o futuro. Goiás inteiro, por sua gente espalhada em todo o país e terras estrangeiras, pranteou Pedro Ludovico. O que não dizer da família? Esta indigna-se com uma recomendação advinda da presidente da Agepel:
– À família não cabe questionar o local, mas sim agradecer por termos finalizado esta história.
Será? Pedro Ludovico não é só da família, é certo; é de todos os goianos. Mas, digam-me, neste quesito, quem se torna mais goiano que os descendentes de Pedro?



Luiz de Aquino
Escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

quinta-feira, novembro 11, 2010

Ainda: a estátua no quintal

Ainda: a estátua no quintal



“Vista da parte central da Praça Cívica de Goiânia, vendo-se em 
primeiro plano o coreto e, ao fundo, o Palácio do Governo, 
ladeado pelos edifícios da Diretoria da Fazenda e Palácio da Justiça”.

Isso é a legenda da foto, estampada no nº 21 (Ano III) da Oeste (revista mensal), outubro de 1944. Notem que, bem no centro da Praça, no local onde hoje temos o Monumento às Três Raças, ficava um obelisco. Eram três, esse aí era o central e o maior deles (os outros dois estão lá, sem os quatro cilindros de vidro fosco que protegiam lâmpadas. Esse obelisco, que integrava a arquitetura da Praça Cívica, foi demolido para que “os negrões” ocupassem seu espaço. Como se fizessem falta, ou como se o obelisco fosse nota dissonante.

Era a segunda metade dos anos de 1960, ou seja, a ditadura ainda curtia lua-de-mel (juro que escrevi lua-de-mal... Ato falho?) consigo mesma. Ferir as imagens da cidade, tal como havia sido concebida, passou a ser esporte preferido dos inimigos (ou invejosos) de Pedro Ludovico: demoliram o obelisco; transfiguraram o coreto (mais tarde, os prefeitos biônicos Rubens Guerra e Hélio Mauro, o restaurariam); violentaram o desenho (ou design, como é da moda) dos canteiros centrais da Praça Cívica e Rua 82; desfiguraram toda a Avenida Goiás (Pedro Wilson foi quem cuidou de nos devolver os jardins e bancos ao jeito dos tempos originais); arrasaram o complexo arquitetônico da Santa Casa de Goiânia.   

Mas ainda não acabou... A Avenida Anhanguera, que se estendia desde a Praça A, em Campinas, até sua confluência com a BR-153 (antiga BR-14), era um cartão-postal dos mais notáveis de Goiânia por suas palmeiras de guariroba alinhadas no canteiro do meio. Em sua primeira gestão como prefeito de Goiânia (1966/69), Iris Rezende a estenderia até as saídas para Trindade e Inhumas, mantendo a fila de coqueirinhos.

Era 1998, o último ano da dinastia do PMDB em Goiás. Enquanto a campanha eleitoral absorvia atenções, o governo (de poucos meses) de vice e de presidente da Assembleia daria conta de desfigurar a extensa Avenida Anhanguera, removendo o canteiro central um pouco mais de cem mil palmeiras.

Lembrei-me de Pedro Ludovico, durante missa campal na Praça Tamandaré (era um largo de terra vermelha, sem vegetação, hospedagem de parques e circos), no aniversário da cidade em 1970. Recomendaram ao bispo celebrante que omitisse o fundador de Goiânia pois estavam lá o governador nomeado, o comandante do quartel do Exército, oficiais da Polícia Militar, delegados da tortura, o prefeito biônico... Mas Pedro não aceitou o silêncio: solene e decidido, chegou-se ao altar (não me lembro se havia um microfone; devia haver) e deixou bem claro que não tinha por hábito sair de casa para ouvir desaforo.

O vexame ficou por conta das “autoridades”.

Agora, outras autoridades, desprovidas de votos e de competência, decidem por mais um agravo a Pedro Ludovico: decidem, depois de quase vinte anos de adiamentos constantes, que a (finalmente concluída) estátua eqüestre do fundador de Goiânia seja estabelecida no quintal do Palácio.

Não se justifica, de jeito nenhum! Aquele pedacinho de chão era, sim, o quintal do Palácio das Esmeraldas. Ganhou status de jardim porque o filho de Pedro, Mauro Borges, idealizou e começou a construção do Centro Administrativo. A localização desse prédio tem justificativa: em 1961, quando começou a concebê-lo, Mauro Borges notou que a cidade crescia para o Sul. Imaginou que, num dado momento, algum administrador haveria de estender a Avenida Goiás para o rumo Sul, então o edifício de onze andares foi ali construído para proteger o Palácio (declaração de Mauro Borges ao repórter Benevides de Almeida, da Folha de Goiás, na década de 1970).

Coisas erradas são confirmadas, aqui em Goiânia: as invasões da Rua 115; o antigo Palácio das Campinas (um barracão de péssimo gosto na Praça Cívica, em frente aos Correios); a remoção das características do edifício originais dos Correios (era “art déco”, virou nada); a instalação do Monumento das Três Raças em lugar do obelisco... Enquanto isso, coisas que deveriam ser indiscutíveis viram piada. Como isso de pôr a estátua de Pedro no quintal, no canto que, disseram alguns de uma estranha “comissão de notáveis”, é o único disponível.

Em se tratando de Pedro Ludovico, disponível é o melhor lugar – e o quintal não o é. Seja o local das três figuras símbolo das raças (?). Como também seria de boa iniciativa a reconstrução do obelisco maior, a remoção dos automóveis da Praça Cívica, a demolição do pardieiro que já foi sede da Prefeitura.


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Luiz de Aquino é escritor, membro da Academia Goiana de Letras, escreve aos domingos neste espaço. E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com