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segunda-feira, novembro 15, 2010

Duas cartas para o jornal

Ambas em torno da questão da estátua de Pedro Ludovico, fundador de Goiânia. 
A primeira foi veiculada segunda-feira, 15 de novembro, no Diário da Manhã; a outra, terça-feira, 16 no mesmo espaço (Opinião do Leitor, pág. 5).


A PRIMEIRA
(publicada hoje, 15/11, em http://www.dmdigital.com.br/index.php?edicao=8405&contpag=1):


Goela abaixo: nunca mais!

Por que razão a Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico Teixeira teima em plantar a estátua do fundador de Goiânia no quintal do Palácio? Pelo que se sabe, a concepção da homenagem obedece a um plano que previu que a mesma ficaria na Praça Cívica, com a evidência que merece o maior de todos os nomes da história de Goiás.
Já escrevi, em várias crônicas e outras matérias jornalísticas, que existe um espírito-de-porco que tem por meta denegrir ou reduzir a importância de Pedro Ludovico Teixeira Álvares na vida política, administrativa, econômica e social de Goiás. Como não encontram manchas na vida do homem, tentam agora diminuir sua importância.
Transformem o esdrúxulo barracão que serviu de sede para a Prefeitura de Goiânia, demolindo-o e instalando-se ali um Memorial da Cidade, com a estátua em lugar de honra, como merece a memória de Pedro.
Fala-se de uma comissão, constituída de escritores, que participou da escolha do malfadado local, na Rua Oitenta e Dois, em frente à esquina com a Rua Oitenta e Cinco, no quintal do Palácio, lugar onde, como disse o deputado Carlos Leréia, os “coronéis” de antes amarravam as montarias. Diz-se que o local foi imposto pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que não permite uma estátua eqüestre no conjunto “art déco” da Praça – mas o IPHAN permitiu ou permite a desfiguração do prédio do Correio?  E permitiu ou permite o “Três Raças”?
De tanto que se tem falado nisso, veio à tona uma ponta que parece verdadeira: o que há mesmo, envolvendo o IPHAN (não consegui saber da diretora Salma Saddi se é verdadeira a informação), é que a presidente da AGEPEL (a agência que leva o nome de Pedro Ludovico) impôs a localização e a atribui ao órgão federal.
O que se comenta ainda – não posso confirmar a veracidade – é que os escritores membros da tal comissão disseram amém à presidente da AGEPEL, acatando sem contra-argumentar, a escolha feita. E comenta-se mais. Aliás, questiona-se: o que levou a atual presidente da AGEPEL a impor-se no cargo? Tinha-se por certo que Nasr Chaul continuaria presidente por todo o governo Alcides Rodrigues, mas de repente o noticiário deu conta de que a secretária da Cidadania entregou o cargo, a chave do carro funcional e o telefone celular oficial, mas exigiu, na condição de presidente de partido da base, a cadeira da Cultura.
Para o meio, e me refiro à maioria dos militantes culturais do Estado, a troca não foi agradável. Goiás tem dois nomes fortíssimos na gestão cultural, nomes que se firmam por suas ações – Nasr Chaul e Kleber Adorno. Um “estranho no ninho” não foi de bom aceite.
Por outro lado, questiona-se, há anos, a simpatia de que desfruta a sra. presidente: ela consegue, ao contrário de inúmeros (e muito competentes) colaboradores, estar bem com todos os governos. Continuará com o próximo? Ou já se ajeitou na esfera federal, ou mesmo na municipal?
Não preciso enumerar segmentos dentro do meio cultural de Goiás para demonstrar o valor dos nossos artistas; ainda que o Estado seja apenas 3,5% do concerto nacional, nossas ações culturais nada devem aos demais pólos de cultura do país. E a atual presidente da AGEPEL não contribuiu com nada para essa valorização.
No turbulento ano de 1968, na Universidade Católica de Goiás, aprendi, de tanto ouvir e constatar, que autoridade é conhecimento. Acho que essa frase não ecoava na mente de alguns alunos, pois, sabendo que os professores da UCG eram os mesmos da Universidade Federal, os alunos “de lá” deviam, também, ter ouvido a prédica.
Pela imprensa,  lemos que autoridade é quem obteve votos, ou se fez investir do poder de mando e (ou) decisão pelo legítimo caminho do concurso; ou ainda pela caneta poderosa dos que, temporariamente, ocupam tronos; por serem os anos da ditadura, aqueles desde 1964, vimos acontecer arbítrios que atentaram contra a liberdade, a dignidade e até mesmo contra a vida.
Daqueles tempos, algumas vítimas (ou a gente imaginava vítimas algumas pessoas) trocaram de lado e começaram a se sentir tão ou mais poderosas que os de fardas e estrelas. Sim: há pessoas, entre os perseguidos daqueles tempos, que não poderiam mesmo, em regime de exceção, exercer cargos públicos, pois, mesmo em tempos de liberdade -  esta liberdade que nos permite até xingar o Presidente da República – cometem arbítrios como se tudo pudessem. E querem nos forçar a engolir suas decisões arbitrárias, truculentas e inoportunas.
A gente nao quer mais, sra. presidente! Nossas goelas já engoliram o que não era de bom gosto; agora, podemos dizer não.

Luiz de Aquino
Escritor, membro da Academia Goiana de Letras.





A SEGUNDA
(http://www.dmdigital.com.br/index.php?edicao=8406&contpag=1):




Ainda regurgito

Alguém me escreve, via Net, para contestar-me: diz que centralizei na pessoa da presidente da Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico a responsabilidade pela escolha do malfadado ponto onde se instala a estátua do fundador de Goiânia e patrono da Agência de Cultura por ela presidida.
A pessoa esclarece-me que a presidente “apenas” acolheu a sugestão do escritor Bariani Ortêncio: “Ele ligava várias vezes por dia, insistindo na localização da estátua; depois, várias pessoas passaram a telefonar também, e os funcionários deduziram que eram orientados pelo escritor, que mora a poucos metros da Agepel (que funciona no primeiro andar do Centro Administrativo) e mais próximo ainda do ponto escolhido para o monumento”.
Quis duvidar. Mas, aí, vejo a crônica de Bariani em “O Popular” de 14/11/2010. No segundo parágrafo, ele declara (ou confessa): “A escolha do local, aprovado pela Agepel, foi tomada mediante consulta aos historiadores José Mendonça Teles, Ubirajara Galli e eu”.
Os três são membros do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, entidade que congrega notáveis escritores locais, poucos deles geógrafos ou historiadores de fato e de direito. Ali chegaram por questão de honraria, imagino eu. Mas em Goiás as pessoas se apossam de títulos honoríficos a bem-prazer; só não se pode se dizer médico, pois o Conselho Regional de Medicina, vigilante, processa o tal por charlatanismo, no que faz bem.
O IHGG fica bem em frente ao local onde se pretende pôr, para tristeza da família, de Pedro Ludovico, a estátua equestre. O tema, além de ocupar grandes espaços de opinião na imprensa, é assunto obrigatório entre os que se ocupam da história e do urbanismo locais. Na última sexta-feira, na calçada do Grande Hotel, desviei a atenção da boa música do evento para dar atenção a amigos e conhecidos que querem entender melhor essa decisão um tanto falaciosa.
As pessoas querem o fundador em lugar de honra; não é por estar em casa que a dignidade pode ser colocada no quarto de despejo. A sala de visitas é a Praça, em seus pontos solenes. Há pouco mais de quarenta anos, removeram o obelisco para instalar o Monumento às Três Raças (também obra de Neusa Morais). A Praça Cívica, que também leva o nome do fundador de Goiânia (apesar dos protestos de seu mais expressivo amigo, o Prof. Venerando de Freitas Borges), é a sala de visitas da cidade. Essa praça é espaço do Estado, e não da municipalidade – informação essa que escapou a descuidados vereadores que legislaram sobre terreno alheio. Cabe ao Governo do Estado decidir sobre ela e sobre isso já se pronunciou o governador eleito, Marconi Perillo.
No apagar das luzes, será de destacada grandeza a atitude do governador Alcides Rodrigues no sentido de adiar a finalização deste caso. Fala-se muito no custo da estátua – custo esse que, é óbvio, tornou-se maior diante das incontáveis protelações. Por um tempo, houve a total omissão do prefeito (1993/1996), depois a transferência do encargo para o Governo Estadual (na gestão do prefeito Nion Albernaz). As delongas magoaram profundamente a escultora, fui testemunha disso.
Logo após a morte de Neusa Morais, dediquei-lhe algumas crônicas e numa delas sugeri uma estátua em sua homenagem – nenhum escultor local, nenhum artista plástico, nenhuma autoridade política ou cultural respondeu-me; agora, são dezenas os que a usam para acusar as autoridades pela demora.
Na esteira dessas protelações, vem a ocasião: quem nomeou a tal comissão de Bariani, Bira e José Mendonça? E porque os outros dois membros da Comissão concordaram com a escolha de Bariani, que agora tem o privilégio de acordar e olhar para a estátua?
Porque essa comissão, em lugar de escolher lugar tão mesquinho para o monumento, não propõe às autoridades um conjunto de estátuas para ornamentar um jardim das artes na cidade? Teríamos lá Leodegária de Jesus , José Décio Filho, Frei Confaloni, Bernardo Élis, Eli Brasiliense, Léo Lince, Otavinho Arantes, Cici Pinheiro, José Godoy Garcia, Basileu Toledo França, João Bênio, Maestro Jean Douliez, Joaquim Edson Camargo, Belkiss Spenziere, D. J. Oliveira, Dinéia Dutra e tantos, tantos mais como numa festiva calçada de bem-estar e poesia, música e teatro, cinema e formas e cores...
Vá lá – e para dar crédito à pessoa que me contou o fato (confirmado de próprio punho por Bariani em sua citada crônica de domingo) – que a presidente da Agepel tenha apenas acatado uma sugestão. “Ela achou que, acatando a propositura, ficaria simpática aos olhos do meio cultural, onde não desfruta de boa acolhida”. Mas os propositores dessa coisa têm boa acolhida em seu próprio meio? Se provocar, é possível que  obtenham no mínimo um desagravo do IHGG, da Academia Goiana de Letras ou ainda da União Brasileira de Escritores (o corporativismo é forte, minha gente!). Mas não se trata, aqui, de execrar pessoas ou louvá-las, pois ambas as decisões seriam injustas e pessoais. Importante é reconduzir o comportamento para o bem-estar geral, em lugar de fomentar o fogo das vaidades.
Goiânia e Goiás muito receberam das penas de Bariani Ortêncio, José Mendonça Teles e Ubirajara Galli, não serei eu quem os recomenda nem os contesta  - seus escritos, em livros e jornais, estão aí para os atuais e a posteridade. Entretanto, compete-lhes mais: agir de conformidade com seu compromisso ante o futuro. Goiás inteiro, por sua gente espalhada em todo o país e terras estrangeiras, pranteou Pedro Ludovico. O que não dizer da família? Esta indigna-se com uma recomendação advinda da presidente da Agepel:
– À família não cabe questionar o local, mas sim agradecer por termos finalizado esta história.
Será? Pedro Ludovico não é só da família, é certo; é de todos os goianos. Mas, digam-me, neste quesito, quem se torna mais goiano que os descendentes de Pedro?



Luiz de Aquino
Escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

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