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sábado, março 26, 2011

Lustrando o umbigo e lambendo a cria

Lustrando o umbigo e lambendo a cria

Fernando Py, crítico e poeta carioca

Acabo de receber de Fernando Py dois recortes do jornal “Tribuna de Petrópolis”. Num deles, de 19 de novembro, o poeta e crítico carioca, morador de Petrópolis, na região serrana do Estado do Rio, comenta meu livro “Poemas de amor e Terra”; no outro, do mesmo jornal, mas da edição de 26 de novembro, ele analisa “PW – O Mundo Impossível”, de Lucas Leão Alves (meu filho mais novo).

Fernando Py discorre muito confortavelmente sobre a poesia que se produz em todo o país. Dele, escreveu Sylvio Adalberto, no Jornal Poiésis – Literatura, Pensamento & Arte: Nascido em 13 de junho de 1935 no Rio de Janeiro, Fernando Py é hoje uma referência nacional quando o assunto é literatura. Com uma produção poética distinta, é também um competente tradutor e crítico literário.

Em sua coluna no periódico de Petrópolis, ele enfoca, a cada semana, dois autores. Ao falar de mim, coloca-me junto do poeta cearense residente em Recife Everardo Norões, autor de “Retábulo de Jerônimo Bosh” (Rio de Janeiro, 7letras, 2008). Py tornou-se amigo do poetariado de Goiás há anos e já tem publicado livros críticos sobre nossa poesia. Agora, e sobre mim, nesse livro de 2007, ele diz:


“...o goiano Luiz de Aquino exercita seu prazer de escrever poesia (...). Neste livro, são predominantes os versos de amor e aqueles que se conectam à terra, ou melhor, às terras que já visitou e lhe deixaram impressão especial, sem esquecer a terra natal, como no poema ‘Em João Pessoa’: ‘Morasse em João Pessoa, / ai! / Morreria de saudade / de Goiás’. Mas os que se referem ao amor são os mais significativos. Aquino aborda vários tipos: há poemas sobre a ingenuidade amorosa, sobre o amor maduro e até os fortemente eróticos. Destacam-se, a meu ver, ‘Lembranças de porto’, ‘Distante’, ‘Duas línguas’, ‘Saber de Néctar’, Um beijo morno e fácil’ e  ‘In natura’. Vale a pena uma leitura cuidadosa”. 
As capas dos livros, da publicaçao Goiânia em Prosa e
Verso (Sec. Municipal de Cultura de Goiânia e PUC de Goiás). 

Em outra edição, a de 26 de novembro de 2010, ele enfoca dois livros: “Cabeças de segunda-feira”, de Ignácio de Loyola Brandão, e esse aí, ó:


PW – o mundo impossível, de Lucas Leão Alves (Goiânia, Universidade Católica de Goiás, 2007) Novela de aventuras escrita por um garoto de pouco mais de dez anos (e que prefere ser considerado “pré-adolescente”). A história toda supreende pela fantástica imaginação. Lucas cria um mundo “impossível”, PW, onde é tudo fruto de situações inverossímeis, criadas contudo com grande eficiência. Temos aqui visível influência de leituras de livros (os acontecimentos em PW lembram as narrativas das viagens de Gulliver, ou as aventuras mentirosas e fascinantes do Barão de Munchausen, tudo isso semeado com temas tirados á física teórica, como a noção de “mundos paralelos”, p.ex., e de histórias em quadrinhos, como as de Batman. PW é um mundo incrivelmente próprio para também ativar a imaginação do leitor – enquanto está lendo a narrativa, a noção que ele se faz desse conjunto de casos fantásticos e fascinantes vai tomando corpo em sua cabeça, acabando por fazê-lo aceitar sem questionamentos essas situações incríveis e maravilhosamente inventadas e descritas por um garoto. E o leitor sai da leitura com a sensação de haver redescoberto a própria infância, de haver topado inesperadamente com um escritor no seu exercício de formação. Imagino como se fará importante o escritor Lucas Leão Alves quando for um adulto maduro. É viver para ver”.

Bem... Todos gostamos de ser lidos e comentados – sobretudo quando se nos cabem elogios, e ainda mais quando o autor é consagrado nacional e internacionalmente. Mas quando o agrado atinge um filho... Aí a nossa corujice fala alto. Muito alto! Por isso, exponho meu coração ao Fernando Py, feliz e agradecido.



Eu e Lucas, no lançamento(2007),
* * *

sexta-feira, março 25, 2011

Poeminha meu, escrito num tempo que fica a cada dia menor nas imagens da lembrança e que, agora, ganhou adornos nas mãos e no talento criativo da Jô Aciole. O título é

Noturno

quinta-feira, março 17, 2011

Vestida de azul e branco…


Vestida de azul e branco…



O tempo era aquele, antes dos Beatles, da pílula anticoncepcional e do golpe militar. Vivíamos a efervescência do chamado pós-guerra, os costumes mudavam-se rapidamente, os tabus eram desafiados. Falava-se em “lua-de-mel experimental”, o que já chocava as vovós e os papais, mas logo falaríamos em amor-livre. A indústria farmacêutica anunciava uma pílula que, consumida diariamente por 28 dias, evitaria a gravidez. O assunto dominava as conversas entre os jovens e ganhava, discretamente, espaços na mídia.

Sobrados de Marechal Hermes. Num desses vivi a adolescência.

Pasmem! No Rio de Janeiro, no meu bairro de Marechal Hermes, no subúrbio, nos últimos anos da década de 1950 e início dos anos de 1960, eu, na faixa dos 13 e 14 anos, presenciava, da sacada do sobrado onde morava com minha avó e tios, cenas que antecipavam o tal de amor-livre: eram casais em motonetas (as inesquecíveis Lambretta e Vespa), a moça sempre na garupa; paravam na rua lateral (nossa casa era na esquina) e ali mesmo, encostados na “montaria”, começam a beijar-se e a tocar-se; eu, meu irmão e um primo (ambos dois anos mais novos que eu) descíamos, silenciosamente, a escada; um portão de serviço, em armação de madeira e forrado de flandres, valia-nos como observatório, pois as lâminas do zinco ficaram furadinhas... 
Vespa, 1960.

Lambreta, também de 1960.

Víamos as mãos atrevidas – quatro mãos de cada casal – invadirem zonas proibidas, como seios, nádegas e virilhas. As moças auxiliavam os parceiros a aplicar o preservativo e ali mesmo, protegidos da parca iluminação pública (mas não de nossos olhos infantes e curiosos), amavam-se livremente. No dia seguinte, cabia a nós, os meninos da casa, varrer das calçadas os restos do amor quase oculto...


Ilustração de Elson (DM) para esta crônica no jornal
Ah! Tenho uma bonita história, de uma moça, colega dos tempos de Ginásio no Colégio Pedro II, no Rio; concluindo o Ginásio, escolheu ser Normalista, ingressando no rigoroso Instituto de Educação do Rio de Janeiro, em processo seletivo de elevado grau de dificuldade. As estudantes desse curso, em seus belos e elegantes uniformes, eram chamadas de Normalistas. Uma música, na voz de Nelson Gonçalves, ocupava as paradas de sucesso dos rádios: “Vestida de azul e branco / trazendo um sorriso franco / num rostinho encantador. / Minha linda normalista / rapidamente conquista / meu  coração sem amor”. (Música: Benedito Lacerda; letra: David Nasser - http://www.youtube.com/watch?v=Z2UfRnGxHOs&feature=player_embedded).

Como é natural, a moça arranjou um namorado – moço mais velho, com a vida já num caminho definido. Isso era 1962, 63. Durante as férias do final de 1963, minha amiga, filha única, descobriu-se grávida.


A elegância era indício de sobriedade das futuras professores
Imaginem o escândalo! A diretoria do Instituto chamou os pais da Normalista para estressantes reuniões; depois, novas reuniões, já com a presença do namorado da moça – a ela cabia apenas ouvir o que discutiam e acatar o que decidissem os outros. E a decisão foi, no entender de nós goianos matutos, uma forquilha: a menina deveria se casar ou seria expulsa do IERJ. O argumento era simples e fortíssimo: como uma Normalista pode educar crianças se pecou contra a castidade que deve nortear as moças de família? Que escola aceitaria uma professora que era mãe solteira? E que pais confiariam numa professora com esse desvio de conduta?

Instituto de Educação do Rio de Janeiro
A paixão de vida da minha amiga era o ensino. Aceitou casar-se com o don-juan em questão, mas aquele foi um casamento para satisfazer caprichos da congregação de professores do IERJ. Pouco tempo depois de formada, separou-se do marido condicional e, quando as leis brasileiras permitiram o divórcio, legalizou a união com o homem que – depois de sozinha – ela escolheu como o companheiro da vida inteira. Já os professores sisudos e caretas do IERJ acabaram por amargar as transformações que abalaram o mundo naquela mesma década.

Essas lembranças mexem com meus conceitos... Calculo que as moças das garupas da “lambretas” são, hoje, vovós que já dobraram a marca dos 70 anos e vivem, certamente, a espantar-se com as posturas de seus netos e netas; e confiro, também, que aqueles professores moralistas que tentavam santificar as normalistas poderiam ter vivido o bastante para conferir os costumes de suas bisnetas.

Sim: aquele era um tempo em que virgindade feminina era virtude. Imaginem!

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L.deA., naquele tempo...
Luiz de Aquino é escritor e  jornalista.

terça-feira, março 15, 2011

Insegurança no Parque Carmo Bernardes

Inauguração: L.deA. ao lado do busto de Carmo Bernardes, no Parque


Insegurança no Parque Carmo Bernardes


Há menos de dois anos, a Prefeitura de Goiânia inaugurou um dos mais belos dentre todos os parques da cidade – o Parque Carmo Bernardes, na região sudeste de Goiânia ou, mais precisamente, no Parque Ateneu. A convite do presidente da Agência Municipal do Meio Ambiente, Clarismino Júnior, redigi um texto que busca identificar o homenageado, meu amigo pranteado Carmo Bernardes, escritor e sertanista. Agora, recebo de um amigo lá residente o seguinte informe:

“O parque Carmo Bernardes, no Parque Ateneu, aquele mesmo onde há um texto seu na estátua do escritor que dá nome ao lugar, está bonito. Pena que sendo usado por motoqueiros e ciclistas, que compartilham a pista de caminhada com os usuários. Mas não é só isso: cães das raças pitbull e rotweiler, sem focinheiras, também dividem as dependências do parque estranhando crianças e rosnando para quem anda por ali. E agora vem o pior: traficantes e drogados infestam o entorno dos dois lagos, principalmente na madrugada de sábado para domingo. Recentemente houve um assassinato ali, relacionado com drogas. Os vigilantes municipais afirmam não ter poder de polícia e a segurança do parque está comprometida. Infelizmente, nossa representação política aqui integra o bloco da adulação. Ajuda a gente aí através de seus artigos que têm profundo poder de influência”.

A minha homenagem ao amigo que dá nome ao Parque
Vejo, pelos noticiários da tevê, o quanto as Guardas Civis Municipais no Estado de São Paulo atuam na segurança – e não falo da Grande São Paulo, mas das cidades do litoral e do interior do Estado. Aqui, caminhamos a passo de tartaruga: a Guarda Municipal, parece-me, é definida apenas como uma corporação para a guarda patrimonial dos bens públicos, e ainda assim o contingente é mínimo, haja vista o vandalismo que agride prédios públicos e bens artísticos, arquitetônicos e históricos da capital.

A Polícia Militar vive um momento de crise; quando da prisão de 19 militares sob os indícios da prática de morte contra prováveis suspeitos (redundância? A moda agora é essa; ser suspeito, hoje, já é ofensa), aquela que deveria ser a nossa tropa de elite agiu de modo corporativo negativamente, intimidando jornalistas da Organização Jaime Câmara com suas fardas pretas, seus carros possantes e suas sirenes assustadoras; e o parlamentar que diz representar as corporações policiais militares agiu de modo a tentar inocentar os presos – estes com fortíssimos indícios de responsabilidades ilegais – quando a sociedade (e o lado bom da PM) esperavam dele atitudes sóbrias.

Por outro lado, a legislação relativa a drogas é benevolente: inocenta totalmente os usuários e concede ao traficante o direito de abandonar as drogas no chão, ao seu lado, esquivando-se cinicamente do flagrante de posse, permitindo-lhe passar por usuário... Inocente e insuspeito usuário.

Permitam-me, também, indagar alguns dados: gostaria muito de saber os números de assassinatos contra jovens envolvidos com o tráfico antes e após o fechamento do projeto Cidadão 2000, que era mantido pela prefeitura. Tenho a impressão de que essa informação é decisiva. Adolescentes e jovens são executados todos os dias, para desespero dos pais, das famílias, das comunidades. Comenta-se que há uma certa acomodação por parte dos policiais, que preferem ver os marginais se eliminando, mas não creio nisso: nenhum policial – a não ser que se alinhe entre os monstruosos agentes que preferem matar a proteger – acomoda-se ante o crime.

Devo dizer, ainda, que a sociedade tem se esforçado para evitar a falência moral dos jovens – e, por consequência, das famílias –, mas a luta está desigual. Professores e pais empenham-se, religiosos também; mas há comerciantes que preferem subvencionar os maus policiais que matam, em lugar de fortalecer o sistema escolar e os projetos sociais que visam a afastar o jovem das ruas e das drogas.

E quando enfatizamos, como agora, os bairros próximos ao Parque Carmo Bernardes, não os isolamos do resto da cidade. A periferia em seu todo, mas o Centro histórico, os ditos bairros nobres, as proximidades das escolas e das igrejas,  tudo – e isso acontece em todo o país – está tomado pela delinqüência, pelo tráfico, pelos pequenos roubos, pelos assaltos e as execuções ordenadas por traficantes ou encomendadas por maus comerciantes.

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Luiz de Aquino – escritor e jornalista

Sarau por Castro Alves e pela Poesia

Leda Selma e eu com o presidente da Câmara, Vereador Iram
Saraiva

Sarau por Castro Alves 
e pela Poesia

(Realizado na noite de 14/03/2011, no Auditório Carlos Eurico, da Câmara Municipal de Goiânia)
Abertura: Vereador Ministro Iram Saraiva, presidente da Câmara
Cerimonial: Jacir Silva
Apresentação dos poetas: Luiz de Aquino

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O dia 14 de Março foi instituído, por lei, como Dia Nacional da Poesia por ser essa a data de nascimento do poeta Antônio Frederico de Castro Alves (1847/1871), ou apenas Castro Alves, como ficou conhecido na História do Brasil. Castro Alves é tido como “o último dos românticos” e também como “o poeta dos escravos”, em face de sua luta e da densidade de sua obra em defesa da abolição da escravatura no Brasil.
Iram Saraiva - Homem de vasta história de vida (professor, advogado, vereador, deputado estadual, deputado federal, senador e, depois, ministro do Tribunal de Contas da União), o presidente da Câmara Municipal de Goiânia, o novamente vereador Iram Saraiva, encomendou ao poeta Luiz de Aquino um evento que marcasse bem o Dia Nacional da Poesia. O escritor conclamou Leda Selma, da Academia Goiana de Letras e escritora de poesia, contos e crônicas, e o jovem poeta Kaio Bruno, do grupo Letra Livre, para, com ele, organizar o evento. O resultado foi a participação de 25 poetas, alguns deles jovens que, sem qualquer dúvida, pontuarão os espaços em futuro breve, ao lado de nomes conhecidos da comunidade goianiense.
Iram Saraiva presidiu o evento, que teve também a participação do diretor Administrativo e Financeiro da Câmara, o professor, poeta e ex-vereador Eurípedes Leôncio, exímio declamado, especialmente dos textos do homenageado Castro Alves. Na mesa, também os poetas Getúlio Targino e Leda Selma (respectivamente vice-presidente e primeira secretária da Academia Goiana de Letras), Heloísa Helena de Campos, que preside a Academia Feminina de Letras e Artes de Goiás, e Edival Lourenço, presidente da União Brasileira de Escritores de Goiás.
No decurso, prestou-se homenagem ao vereador Gari Negro Jobs, falecido na sexta-feira, 11 de março. José Batista da Silva, nome real do vereador, era também artista - fazia esculturas e entalhes em madeira, entre outras práticas do gênero.
O poeta e músico Rafael Loiola executou, ao acordeon, músicas apropriadas a cada poema apresentado, para alegria de todos os participantes e plateia.  A festa estendeu-se por duas horas muito bem preenchidas e sugeriu-se que outros eventos do gênero, atingindo outros segmentos da cultura e das artes, ocorram na sede do Legislativo da Capital.


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Poetas participantes:
Ana Cárita, Ana Cris, Cadillac, Camila Leite, Clara Dawn, Diego de Moraes (poesia e música), Diego El Khouri, Edival Lourenço, Edmar Guimarães (intérprete: Vânia Majadas), Elza Nobre, Ercília Macedo Eckel, Eurípedes Leôncio, Getúlio Targino, Heloísa Helena, Isabel Dias Neves, José de Arimatéia (homenagem ao Gari Negro Jobs), Kaio Bruno, Leda Selma (discorreu sobre Castro Alves), Luiz de Aquino, Maria Helena Chein, Placidina Lemes de Siqueira, Rosalvo Leomeu e Sônia Cury.
 Ao acordeon: Rafael Loiola (poeta e tecladista)

domingo, março 13, 2011

Pois é, eu vi!


O DM (Diário da Manhã, de Goiânia) completou, neste 12 de março, 31 anos de existência combativa. Orgulha-me a minha profissão de jornalista, e orgulha-me também ter integrado as equipes do semanário Cinco de Março e, em seguida, do Diário da Manhã, onde permaneço até hoje. Para festejar, Batista Custódio convidou a nós, os da "velha guarda", para contar alguma coisa; o resultado é o suplemento que circula hoje, 13 de março, no DM e que pode ser lido também na versão eletrônica - www.dm.com.br - em sua íntegra. Meu depoimento está na última página, mas transcrevo-o a seguir.


L.deA.







Pois é, eu vi!


O ambiente era o do semanário Cinco de Março; corria o ano de 1979. A equipe era pequena, empenhada, destemida – Marco Antonio Silva Lemos, Sônia Penteado, Valterli Guedes, Valdomiro Santos, Luiz Augusto Pampinha, Sebastião Póvoa, Jorge Lira, Tacilda Aquino, Antônio José de Moura, Luiz Contart... Os fotógrafos eram poucos, também – Lorivaldo, Edson, Diomício... Eliezer Penna era o editor-chefe. E os diretores eram Batista Custódio e Consuelo Nasser. Júlio tinha seus 17 anos e Fábio, não mais que 12.

Um dia, deparo-me com Carlos Alberto Sáfadi deixando a sala do Batista. Eu soubera, na véspera, que ele deixara o Jornal Opção, então diário. Supus que viria para o Cinco de Março, mas ele me antecipou a notícia, pedindo segredo: “Vai surgir aqui mais um diário”.

Mal entrou 1980, o ambiente do CM começou a mudar. Havia um entra-e-sai de jornalistas vários, alguns bastante conhecidos, vindos de outros veículos; e os forasteiros, chamados por Batista Custódio especialmente do Rio e de São Paulo.


Batista custódio,  o que não se contenta com as notícias: tem que sonhar!

O espaço que antes era estacionamento para nossos velhos carros, tornou-se um canteiro de obras; em poucas semanas, a edificação abrigava toda a imensa redação do Diário da Manhã. Migrei do CM para o DM, meu chefe era o Marco Antônio, editor de política. O Cinco de Março continuou circulando, só seria desativado em agosto daquele mesmo ano.

No decorrer de fevereiro todo, é possível que tenhamos começado ainda em janeiro, produzimos muitas edições-zero. Em cada uma usava-se um desenho para a primeira página,até que se definiu por um modelo; depois, foi a vez de se estabelecer a tipologia que se tornou marca. Era emocionante sentir que fazíamos um jornal novo! Eram novas edições todos os dias, como se o jornal fosse diretamente para as bancas, mas tudo era experiência; e então, um belo dia, nós, formigas-operárias, ouvimos: “Agora é pra valer! Amanhã estaremos nas ruas!”.

Lembro-me bem... A cidade já nos esperava. Outdoors espalhados por Goiânia inteira mostravam fotos de alguns de nós. A minha cara não apareceu nesse cartaz, fiquei triste por isso. Na redação do DM existe uma reprodução desse outdoor. A equipe era muito maior que a do Cinco de Março – a maior já montada em Goiânia. Escalou-se a fina flor do jornalismo para o que, em poucos dias, era tido como o melhor jornal do Centro-Oeste. Tínhamos Sáfadi, Marco Antonio Coelho, Servito Menezes, Paulo Sérgio Moreira, depois vieram Washington Novais, Reinaldo Jardim... E tínhamos articulistas de renome nacional, como Carlos Drummond de Andrade e Jânio de Feitas.

Bem! Aí o jornal cresceu, incomodou, fez-se presente! Tudo o que brilha incomoda – disse a cobra ao vagalume. E a cobra atacou o pirilampo, que teve sua luz apagada temporariamente, como diziam os locutores de A Voz do Brasil aos navegantes...

Pois é! Falar de passado é lembrar a história. Nós, jornalistas, somos uma espécie de cartorários da história. Mais da metade de minha vida, passei-a envolvido com os jornais, as revistas e as notícias. E sou feliz ao lembrar que, neste aniversário de 31 anos do Diário da Manhã, posso me dizer que eu estava lá! Ou, plagiando Gonçalves Dias: “Meninos, eu vi!”.


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Naquele tempo: eu, entrevistando Athos Magno, recém chegado do exílio


sexta-feira, março 11, 2011

Nascer para as Letras


Nascer para as Letras


A moça formou-se em Letras… Bem, acho que é do meu tempo, e o nome do curso, então, era Letras Vernáculas. Licenciou-se, ou seja, tornou-se professora de Língua Portuguesa e Literatura – neste particular, incluindo o que se escreve com arte em Portugal, no Brasil e nas demais nações lusófonas. Mas para formar-se, teve de afastar-se da família e vir para Goiânia. Era concluir o Curso Normal e depois ingressar na Faculdade de Filosofia – a escola superior que, então, formava professores para os cursos Ginasial e Colegial. E como expliquei isso, devo contar aos mais moços o que era o Normal: era um curso profissionalizante, no nível de Colegial (hoje, Ensino Médio), que formava professoras primárias.

Ao que consta, nada havia que restringisse o Normal às moças. Rapazes também podiam formar-se naquele curso, mas a tradição reservava às jovens donzelas o ofício de professoras de crianças. Esse curso era ministrado em Instituto de Educação e em Escola Normal. (Sobre ministrar: tem gente fina por aí que não sabe o que é ministrar, e diz e escreve administrar... Ministrar é uma coisa, administrar é outra).

Pois bem! A moça de quem lhes falo viveu aqueles anos tormentosos que a convenção jornalística e literária brasileira qualificou como sendo “de chumbo”. Era o início dos anos 1970, vivíamos sob a pressão das famílias, naturalmente conservadoras, diante de uma realidade irresistível para os jovens. A comunicação ganhava força com a tevê e os filmes novos chegavam a Goiás em cerca de seis meses, em contraponto com os dois ou três anos de antes. Em síntese, nós, os moços daquele tempo, éramos bem informados. Ou relativamente bem informados.

Essa moça é Josefa Martins Lopes, que incorporou Sampaio ao casar-se. Católica dedicada, como dedicada sempre foi também à leitura. A Literatura, especialmente os clássicos, eram a sua paixão mundana – já que a doutrina Católica era-lhe como o sangue nas veias. Com a simplicidade das pequenas cidades (ela veio de Santa Teresinha, no que era meio-norte goiano e, agora, com o Tocantins, é norte mesmo).

Uma vez formada, e de volta ao interior, dedicou-se ao gratificante ofício do ensino. É certo que o sistema educacional brasileiro, tanto o que o Estado custeia como o privado, que é fonte de fortuna para os empresários do ramo, minimizam o professorado. Mas dificilmente uma profissão, qualquer outra, faça a felicidade do trabalhador como a dos mestres.

Em Goiânia daqueles anos já era muito difícil conseguir bons livros literários. Imagine-se, pois, nas pequenas cidades! A professora Jô Sampaio tinha dificuldades em passar textos de leituras aos seus alunos. Se ao menos tivesse alcance a livros, ainda que não os tivesse no mercado local, ela faria cópias de contos e poemas. Mas senão os tinha...

O jeito foi produzir textos. Por não ter livros o bastante para colher material de ensino, passou ela própria a escrever poemas e contos de acordo com o que precisava. E assim, descobriu-se escritora. Só que ignorava o tamanho de suas possibilidades nesse meio. De criadora literária, e valendo-se do que aprendeu na faculdade, afinou sua capacidade crítica a ponto de produzir belíssimas peças de análise literária, muitas vezes tirando licor das pedras áridas.

Tenho tido o privilégio de ler, em primeiríssima mão, seus novos contos. Vislumbro para ela o acento cativo no pavilhão dos bons, ainda que, todos sabemos, a consagração virá, de fato, depois de lidos pelas gerações vindouras.

Em breve, teremos dela um novo livro à luz. Aos que gostam de boa leitura, sugiro que aguardem notícias da nova obra que, sem qualquer dúvida, cuidarei de alardear aos leitores destas minhas pobres linhas semanais.

Aguardem, pois! Por enquanto, recomendo-lhes a leitura de A Trapezista (a obra está esgotada, mas é quase certo que a encontraremos nos sebos de Goiânia). Por enquanto, privilegiados são seus alunos do Ensino Médio e da Universidade Estadual de Goiás, em Porangatu.


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Luiz de Aquino é escritor – poetaluizdeaquino@gmail.com 
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sábado, março 05, 2011

Guias de coração poeta


O Guia de Meia-Ponte repete o da antiga capital, Vila Boa.
 Guias de coração poeta

Primeiro, o da Cidade de Goiás, antiga capital, histórica, saudosa e sempre amada Vila Boa de Goiás; agora, o de Pirenópolis, a outrora Meia-Ponte que o modernismo de 1890 preferiu trocar por Pirenópolis. Até o momento, meu amigo Elder Rocha Lima produziu dois livros com nomes tão aparentados quanto o são as duas cidades, berços da colonização, da política e das práticas culturais de Goiás: Guia Afetivo da Cidade de Goiás (publicado pelo IPHAN, 14a. Superintendência Regional, em 2008) e Guia Sentimental da Cidade de Pirenópolis (datado de 2010, mas lançado no dia 25 de fevereiro de 2011, no histórico cinema).

As mesmas medidas, o mesmo número de páginas em ambos.


Há, desde séculos atrás, uma rivalidade política e cultural entre as duas cidades, ainda que sejam, ambas, povoadas pelas mesmas famílias. Ciúme bairrista, sem agressão prejudicial, mas com a disputa acirrada por privilégios e destaques. Se Pirenópolis tem as Cavalhadas na Festa do Divino Espírito Santo, a Cidade de Goiás tem a Procissão do Fogaréu; uma foi capital da Província e do Estado, a outra orgulha-se de ter (sem vencer a rival) belíssimo elenco de artistas de várias áreas e políticos notáveis.


Procissão do Fogaréu, em Goiás, e...
,,,Cavalhadas, em Pirenópolis
Rivalizam-se também pela culinária, pelo artesanato e pelo gosto incontestável pelas boas coisas da vida, desde a cumplicidade com os recursos naturais até as impagáveis e amorosas serenatas em que o forte sempre foi, em cada uma delas, as canções compostas por seus nativos. Uma tem a Serra Dourada, a outra, os Picos Pireneus; de uma é o Rio Vermelho, da outra o Rio das Almas. Cora Coralina reinou em uma; Santa Dica na outra. E assim seguem os afagos aos próprios egos.

Por isso e, como contou em seu discurso no ato de lançamento da obra, fugindo de possíveis reprimendas dos de Vila Boa, o Guia Sentimental tem o mesmo tamanho do Guia Afetivo: 144 páginas. A diagramação é do mesmo feitio (e da mesma artista gráfica, Genilda Alexandria). Com isso, desfaz-se do esperado ciúme. Ou espera que sim.

Na contracapa, textos de muita semelhança, ele explica Pirenópolis, como antes explicou a Cidade de Goiás:

“Para construir esta Meia-Ponte não foram convocados artistas, arquitetos, urbanistas e outras figuras importantes (e, às vezes, arrogantes), para planejar, desenhar e definir esses espaço construídos. Ao contrário, foi o povo que fez a cidade sem planejadores e sem máquinas e com poucos instrumentos. Foi feita à mão por pretos, mulatos, caboclos, brancos, travestidos de mestres-de-obras, pedreiros, carapinas, entalhadores, ferreiros, pintores, e tantos outros necessários para levantar as nossas moradas, nos abrigar das intempéries, criar meios de preparar nossa comida, propiciar nosso repouso, acolher nossa vivência amorosa e criar nossos filhos”.

De Elder Rocha Lima, já se falou: é o que se pode chamar de artista completo. Vila-boense pelo nascimento; meia-pontense por origens; goiano pela plena identidade; cidadão do mundo porque seu coração recusa-se a ser uma pedra à beira do rio. Arquiteto, poeta, professor, desenhista (de arte), aquarelista... ainda não o vi no exercício da música, em canto ou instrumento; mas não duvidarei de encontrar um virtuose.

E gosto de registrar que, na festa desse livro, brilharam também a superintendente regional do IPHAN, Salma Saddi, incansável na preservação e na valorização do patrimônio histórico e artístico, mas com o talento de “farejar” qualidade – daí a ocorrência, sob os auspícios de sua repartição, de tantos feitos. E marcar, também a presença alegre e feliz do artista Pérsio Forzani. Este, sozinho, consegue fazer vibrar a alma poética de Pirenópolis.

Estou certo de que Salma e Pérsio, como Elder, são também guiados pelo coração.



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Eu com Pérsio Forzani e Elder Rocha Lima; na parede, aquarelas de
Elder (na festa de lançamento do Guia Sentimental).



Luiz de Aquino – poetaluizdeaquino@gmail.com 

sexta-feira, março 04, 2011



Dia da Imprensa goiana

No dia 5 de marco de 1830, surgiu em Meia-Ponte, atual Pirenópolis, o primeiro jornal a circular no Centro-Oeste brasileiro – Matutina Meiapontense. O informativo logo se tornou o veículo oficial das províncias de Goiás e Mato Grosso e circulou até 1834, com 526 edições. Esse jornal foi uma iniciativa do incansável empreendedor Joaquim Alves de Oliveira e teve como redator-chefe o padre Luís Gonzaga de Camargo Fleuri .

O jornal Cinco de Março
Coincidentemente, a 5 de marco de 1959, uma passeata estudantil pelas ruas de Goiânia foi violentamente reprimida pela Polícia Militar, por ordem do governador da época; daí nasceu o semanário Cinco de Março, idealizado e dirigido pelos jovens jornalistas idealistas Batista Custódio e Telmo de Faria. O Cinco de Março foi um baluarte das liberdades desde seu surgimento até o encerramento de suas edições, em agosto de 1980 (o Diário da Manha circulava desde 12 de marco daquele ano).


A Matutina Meiapontense ganhou, no decorrer do governo de Irapuan Costa Júnior (1975/79), por iniciativa do vice-governador José Luiz Bittencourt, uma reedição de todas os números publicados. Coube ao escritor José Mendonça Teles pesquisar e buscar exemplares da ”Matutina” pelo Brasil afora. Já o Cinco de Março foi, também, alvo do empenho de José Mendonça Teles: por sua iniciativa, o semanário de Batista Custódio teve todas as suas edições microfilmadas. Esse acervo está no Instituto Histórico do Brasil Central, da PUC de Goiás.


José Mendonça Teles
Ambos os trabalhos merecem, para os anais da imprensa em Goiás, minuciosa entrevista com o pesquisador; ou detalhados depoimentos dele, José Mendonça, por escrito ou de viva voz, para os registros do Museu da Imagem e do Som. E que tudo isso seja igualmente reservado para o acervo de um futuro Museu da Imprensa, projeto de que, há onze anos, se ocupa o fotógrafo Nelson Santos.

Autoridades e personalidades de realce desejam muito que o projeto de Nelson dos Santos se realize. Sua sede, indiscutivelmente, há de ser em Pirenópolis, berço da nossa imprensa. O próprio José Mendonça é grande entusiasta da ideia. O que se quer, agora, é apoio das autoridades para que o empresariado também se estimule e esse museu seja instalado.

Estou certo de que o tema interessa diretamente ao governador Marconi Perillo, tanto quanto a todos os jornalistas, historiadores e todas as pessoas voltadas para a preservação da memória histórica de Goiás.


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Luiz de Aquino – poetaluizdeaquino@gmail.com