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terça-feira, maio 31, 2011

Pirenópolis e os mascarados numerados



Aleg(o)ria de Pirenópolis, no conceito
do meu amigo Jorge Braga


Pirenópolis e os mascarados numerados



Está no blog “Cidade de Pirenópolis”, mantido pelo escritor Adriano Curado (http://cidadedepirenopolis.blogspot.com/):


“Numa decisão até o momento inédita, o Juiz de Direito da Comarca de Pirenópolis, Dr. Sebastião José da Silva, julgou procedente a ação civil pública que o representante do Ministério Público propôs contra o Município de Pirenópolis, para limitar a atuação dos Mascarados nas comemorações da Festa do Divino. Segundo a sentença judicial, o Município de Pirenópolis fica condenado a cadastrar, com descrição de roupa e máscara, todas as pessoas que quiserem se vestir de Mascarado na Festa Divino Espírito Santo e lhe dar um número de identificação”, entre outras medidas.

Corre na Internet um abaixo-assinado, em que os signatários tentam convencer o Promotor de Justiça e o Juiz de Pirenópolis da importância da revogação do ato judiciário. Os peticionários têm boa e forte argumentação e demonstram preocupar-se com o risco de empanar o brilho da festa, que hoje é um Patrimônio Imaterial Nacional.

Essas figuras mascaradas integram com forte marca e presença os festejos de Pentencostes, em sua parte profana, e foram introduzidos nos hábitos de  Goiás há quase dois séculos, pelo vigário de Santa Cruz de Goiás, Padre Gouveia de Sá Albuquerque, com permissão do Vigário Capitular Padre José Vicente de Azevedo Noronha e Câmera. À época, alegou o Padre Gouveia o isolamento do povo neste sertão dos Goyases: “A falta de lazer e divertimento está desviando as almas para as festas profanas  nos pagodes e vida mundana”

Padre Gouveia mandou confeccionar o cetro e a coroa, em prata pura, e a bandeira do Divino Espírito Santo; e ainda mandou fazer “pãezinhos do Divino” – espécie de rosca-da-rainha besuntada com calda caramelada de açúcar, que, benzidas, eram distribuídas nas casas como cortesia do Imperador. (Fonte: santacruzdegoias.net/institucional/cavalhada_mais_antiga_do_estado_de_goiAs/).

Cavalhadas de Santa Cruz,
pioneirismo em Goiás.
Adriano Curado questiona: “Essa ação civil pública foi mesmo necessária? Conseguirá o Município de Pirenópolis fiscalizar o trânsito de todos os Mascarados? É possível a aplicação da sentença já nesta Festa de 2011, ou seria necessário uma longa campanha de esclarecimento?”.

A medida pode parecer drástica e ameaçadora, mas defendo-a em nome da segurança pública e, embora pareça paradoxal, da manutenção da festa com suas características, pois os riscos que representam os abusos – criminosos valendo-se da proteção das máscaras – podem resultar na mutilação definitiva do costume.


A iniciativa veio de Daraína Pregnolatto, que dirige uma instituição de arte e cultura. Ela critica, ainda, a iniciativa do governo do Estado de construir um cavalhódromo, postura essa que me chega em tom estranho; os sambódromos do Rio de Janeiro e de São Paulo, entre outros similares (os bumbódromos de Manaus e Parintins, por exemplo) não violentaram as tradições; é que as festas, num dado momento, tornam-se espetáculos públicos e peças turísticas.

Essas máscaras, sim, comprometem a festa.
A energia que se mobiliza contra isso devia ser usada para pleitear melhorias na pavimentação da cidade; e também na retomada das características das máscaras exclusivamente em papel machê, proibindo-se as de borracha, industrializadas. Isso, sim, é lutar por melhorias e tradição. No mais, medidas como cadastramento de mascarados e identificação perante as autoridades são, agora, indispensáveis, pois a imprensa nacional já qualifica o entorno de Brasília como uma das regiões mais violentas do mundo.


Sambódromo, Rio de Janeiro. O carnaval não
morreu nem deixou de ser popular 
Intervenções de governos em festas populares são inevitáveis. Em 1961, Jânio Quadros proibiu o lança-perfumes e o carnaval não se acabou. A Justiça e a polícia aplicam medidas de prevenção ou repressão a qualquer tempo e nada disso coloca em risco a sobrexistência das festas. 

Bumbódromo de Parintins. A festa
virou atraçao turística, mas preservou-se
Contestar providências de segurança é, ao meu ver, agir contra a corrente. Há cerca de trinta anos, apenas víamos a apresentação dos cavaleiros; Gutemberg Nóbrega gravou com os cavaleiros todo o enredo e pôs a fita para rodar, e Mouros e Cristãos passaram a dublar as falas. A tecnologia se aprimora a cada instante e todos sabemos de sua presença em todos os nossos momentos. Rejeitar o cavalhódromo é escolher o atraso.

Mas, pior que isso, contestar a segurança é dar vez ao inimigo.


* * *





Luiz de Aquino, escritor e jornalista.

segunda-feira, maio 30, 2011


José Raimundo Reis da Silva: Zé Reis!


Adeus, Zé Reis! (O de Pirenópolis)


Aquela é uma das casas da Rua do Rosário que resiste ao comércio. A de número 9, morada preferencial do jornalista José Raimundo Reis da Silva, o nosso Zé Reis – Zezinho, para a família; Zezim, para o bom linguajar goianês, pirenopolês, na intimidade das ruas tortas que abrigavam serenatas nas madrugadas.

Rua do Rosário, 9. Arte de Pérsio Forzani para o livro Casas dos Homens
(Volume II), de Jarbas Jayme e José Sizanando Jayme



Nos últimos 17 anos, desde quando realizamos as primeiras reuniões para a criação da Academia Pirenopolina de Letras, Artes e Música, a casa do Zé Reis tornou-se, para mim, um ponto de encontros habituais. Mas o sentimento de admiração e amizade surgiu antes. É que, além da profissão, notamos, ambos, algumas afinidades fortes, como isso de gostar de Pirenópolis, de seu casario ligeiramente desalinhado, do perfil íngreme das encostas e o colorido dos portais e esquadrias. Tudo tendo por fundo as histórias da terra e o murmúrio do Rio das Almas.

Zé Reis no quintal da casa encantada, na Rua do Rosário.
O quintal da casa do Zé Reis vai até o barranco da margem esquerda. As janelas da sala e de dois dos quartos escutam o som destrambelhado da Rua do Rosário. Na casa – varanda, cozinha e quintal – tomávamos cerveja e vinho, curtíamos as delícias dos churrascos e trocávamos histórias pitorescas da cidade e de qualquer outro lugar, evocando causos de famílias e de companheiros de trabalho. Ali, também discutíamos coisas atinentes ao modo de vida, fosse o de Pirenópolis, fosse o de Brasília, do Rio de Janeiro ou Caldas Novas, jamais esquecendo coisas do Piauí e das infâncias inesquecíveis.

A Igreja de Nossa Senhora do Rosário foi restaurada duas vezes, em menos de dez anos;  o trabalho de Zé Reis foi de elevadíssima importância do longo dos dois processos.

Quando, na segunda metade da década de 1990, a Sociedade dos Amigos de Pirenópolis, entidade idealizada por Zé Reis, cuidou da grande obra de restauro da Matriz de Nossa Senhora do Rosário, era ali, na casa número 9 da Rua do Rosário, que conversávamos sobre as novidades. E foi ali que Zezim idealizou e cuidou de correr atrás dos meios para pôr em prática um projeto carinhoso e agradável – Tocando a Obra. Consistia em, no último sábado de cada mês (se não  me trai a memória), apresentar-se um conjunto de boa música na nave da Igreja em reparo. Um desses, justo o de 27 de julho de 1998, José Reis ofereceu-me para, aproveitando a exatidão da data, festejarmos o centenário de meu avô, o maestro Luiz de Aquino Alves (saudoso momento em que Clóvis e Bidoro, exímios instrumentistas, e mais meu pai, Israel, ao lado de outros companheiros músicos, executaram composições do meu saudoso avô-xará). A esse evento opôs-se um maestro argentino, então residente na cidade. O “hermano” desconhecia a história e os vultos em questão; dei-lhe nenhuma atenção e, para meu prazer, nunca mais o vi; e para minha vingança, vencemos as equipes esportivas de sua pátria muitas vezes mais, nestes anos após.

Zé Reis pouco se importava com coisas idas; do passado, ele gostava mesmo era de acumular lembranças boas. Estava, o pequeno gigante da Rua do Rosário, sempre a bolar alguma novidade, ouvir ideias e juntar propostas, apresentar seus sonhos e pôr-se a realizar novos projetos. Para ele, o importante era o agora, que, parece-me, em seu conceito consistia tão-somente em pensar coisas para o amanhã.



Um dia, veio-lhe o câncer, ele o superou: driblou o tumor cumprindo com esportivo propósito o tratamento. Já convivia, então, com os problemas da pressão arterial. Engordou um tanto, nestes 17 anos. Aprendi a gostar dele pela amizade entre ele e Maria Eunice Pereira e Pina,  e com Emílio de Carvalho. Ganhei também essa amizade e cuidei de cultivá-la. E só ganhei, porque aprendi muito com o meu colega e amigo. E dele, também, bem como de Dona Helena, a esposa, herdei a amizade fraterna com seu filho  Marcelo e família, meus vizinhos há bom tempo!

Na manhã de sábado, sua nora Marilene, comadre querida, trouxe-me a notícia triste. Há quase uma semana acompanhávamos a última batalha. O infarto, a transferência de Pirenópolis para Brasília, a internação, os procedimentos, a esperança e, em seguida, o infausto: Zezim se foi!

Dona Helena e o neto Marcelinho: churrasco no quintal. Era carnaval, em 2009...

Abriu-se o branco, não na memória: no coração. Memorizei a casa branca de portas e janelas azuis, suas arandelas, vitrais em guilhotina, as colunas em madeira; o quintal em dois planos, o verdor das plantas, as sombras das grandes árvores, a parreira... A voz troante e feliz do dono, o sorriso ora cúmplice, ora crítico, da dona da casa, a presença amiga de Marcelo e, eventualmente, de Maurício – mais que de Luciana e José Augusto -, dos netos.... E havia os cães, dos quais cuidei sempre de estar distante por razões óbvias.

A casa, a de número 9, Rua do Rosário... A casa está em silêncio, agora; é ela das últimas, senão a última, a manter o aspecto exclusivo de morada, pois as outras cederam espaços ao comércio. Não consigo ver, na sala e na varanda, na cozinha e no pátio, o agito dessas últimas duas décadas. A alma da SOAP - a Sociedade dos Amigos de Pirenópolis -, mudou-se de lá, está montando sala nova, ou uma nova varanda, onde por certo conspirará boas coisas com Emílo de Carvalho.

E nós, os que ficamos, perdemos o rumo, a prosa e muitos planos...


Presença indispensável nos momentos sociais, culturais...


... e políticos de Pirenópolis nos últimos vinte e mais anos.



* * *

Luiz de Aquino, jornalista e escritor. - Fotos por Luiz de Aquino e Nelson Santos; foto da casa: fac simile do livro de Jarbas e José Sizenando Jayme, Casas dos Homens (Volume II).

domingo, maio 29, 2011

Incêndio quase imperceptível

Incêndio quase imperceptível



Amanhece. Ultimamente, pouco me interessa o momento do alvorecer. É que todos os dias resisto ao sono para sentir mais horas na noite, e o corpo pede sono, empurra-me para duas horas, pelo menos, além dos primeiros beijos do sol na atmosfera. Mas hoje, quinta-feira 26, e é maio, fui coincidentemente despertado muito cedo por ligações telefônicas; e ambas aconteceram por engano.

Fazer o quê? O que se faz de melhor nas horas da manhã sem ter que sair da cama: acompanhar os noticiários na tevê. Pouca coisa diferente das notícias da noite anterior, é claro. E há os coleguinhas sensacionais que tentam transformar as tragédias das famílias – as humildes dominam essa faixa de notícias – em espetáculos do “mundo cão”. Evito-os, esgrimando com o controle remoto. Ah, alguns apresentadores – e repórteres também – insistem em falar “essa” e “esse” para o que pede “esta” e “este”. E olhe que o veterano Alexandre Garcia já criticou quem não sabe a diferença...

Deixo a cama, o estômago exige. E os horários. Preciso escrever uma crônica, fico indeciso entre uma crítica ininteligível ante artes, festas e espetáculos, uma análise pertinente sobre os desvios do Ministério da Educação, as queixas sobre o quadro econômico nacional, a sobrecarga de impostos, os descasos para com a saúde pública e, entre os temas menos interessantes, a evidente conveniência política de governos que nomeiam “personas” que já demonstraram incontestável incompetência no mesmo segmento em outras estruturas igualmente de governos.

Alguns telefonemas depois e mudo radicalmente o tema: é que, enquanto telefonava, senti um forte cheiro de coisa queimada; conferi os aparelhos ligados, nada! Deduzi que, como na véspera, alguém estaria queimando lixo aqui por perto. Continuei minha sina. Foi então que Mary Anne retornou e me perguntou:

– Não foi ver o incêndio?

Que incêndio? Então foi isso? Sim, uma moça passava roupas no sexto andar, um curto circuito no ferro de engomar causou um princípio de incêndio, havia bombeiros e equipes de pelo menos três emissoras de tevê. Fui à sacada, o tumulto já estava no fim, a moça que passava roupas feriu-se no braço, e nada mais grave.

Nada? Sim: a evidência de que a segurança nos edifícios é uma piada. Ninguém deu qualquer sinal de alarma e se o incêndio fosse de maior proporção poderia ter nos isolado em casa, sem muitas chances.

Condomínio é assim, um convívio fisicamente próximo, marcado por relações distantes ou totalmente ignoradas. E custa caro. Há ocasiões em que se tem dificuldade para cumprir o compromisso do mês e as cobranças e olhares apontam-nos como criminosos (há alguns meses, compliquei-me com o pagamento de minha cota; o síndico da época pressionou-me, como é do seu dever, e contou minha falha a outros moradores, ganhando o apoio especialmente de um desses que se sentem cidadãos corretos e ímpares; mas deixou de sê-lo ao omitir o ato feio do então síndico, que fingia colaborar com os operários em serviço no prédio e remunerava-se indevidamente para isso...).

Há alguns meses, li que apenas 2% dos condomínios verticais de Goiânia têm bons recursos de segurança. Alguns abusam de grades e câmeras, mas as grades mostram-se vulneráveis quando os funcionários não têm preparo. Sistemas de câmeras obsoletos ou apenas emblemáticos, sem a retaguarda de bom funcionamento, sequer amedrontam os bandidos – estes, agora, já não  se preocupam com câmeras, mostram suas caras livremente, confiantes na impunidade, no desinteresse das autoridades para investigar crimes em que senão há agressão pessoa ou vitimas de lesões ou homicídio.

Enquanto isso, vemos as autoridades liverar gabaritos enormes, torres em série, amontoando num só ponto centenas de famílias sem que a estrutura urbana suporte o impacto. É que rola muita grana nesses investimentos, os agrados a poderosos do dinheiro certamente asseguram boas contribuições nas campanhas eleitorais (e em 2012 haverá eleições municipais).

Triste e concluir que as torres sugerem belos visuais panorâmicos, Goiânia aparecerá na Internet como uma cidade bonita e moderna, as caixinhas eleitorais estarão asseguradas... E o cidadão, ah! Esse que se dane!



* * *


Luiz de Aquino é jornalista e escritor.

sexta-feira, maio 20, 2011

Enquanto ouvia Elisa

Enquanto ouvia Elisa


Sim, é dela mesmo que falo – Elisa Lucinda, poetisa e linda, muitas rimas entre os verdes olhos que encantam o mundo os amores retidos que me enriquecem o peito, a mente e a esperança. Elisa Lucinda fez um xou de simpatia, doçura e poesia, regado a talento e carisma na noite de Pirenópolis na III Festa Literária. Contou de vida, ridicularizou preconceitos, elevou a poesia e o sentimento de arte, exaltou os professores – mas puxou as orelhas dos incautos de qualquer natureza. E quase endeusou a infância, essa fase eternal nas vidas que se reciclam a cada ano no posto, símbolo maior da continuidade da espécie e, principalmente, da capacidade de entender e aprender.



Gilberto Mendonça Teles, poeta feliz em Pirenópolis.
E Gilberto Mendonça Teles... Para mim, esses dois nomes foram os marcos dessa festa. Não os maiores, apenas os mais importantes por suas projeções no ensino e estudo das letras (ele) e na divulgação da literatura como arte (ela); no mais somos todos do mesmo patamar, uns mais conhecidos, outros menos, mas empenhados no mesmo propósito, buscando fazer ou estudar o mesmo – a “religião” poesia, irmã gêmea da prosa boa, de raiz e lírica.


Eu, Lúcia Mendonça, Regina Jardim e Pérsio Forzani. 
Falamos de Cora, José J. Veiga, de Bernardo Élis e Guimarães Rosa, de Jorge Amado e Drummond, de Quintana e  Yeda Schmaltz, falamos de nós e dos nossos poemas. Éramos prosa e verso, muito. De Goiás e de Brasília, mas de nascenças em terras e cultura que fazem diferenças. Minas é forte, e havia o sul e o nordeste, o Pantanal e este Planalto – a me lembrar que Walter Mustafé e Luiz Augusto assinam uma música chamada Pantanalto, marco do cancioneiro goiano(http://www.youtube.com/watch?v=JBC9Gmmckbg).

Escribas na praça, contando histórias de vida.


Nicolas Behr sempre é surpresa, desde os últimos trinta anos em que o conheço; Renata Normanha canta Cânticos, Cristiane Sobral descreve o Pixaim Elétrico e determina: “Não vou mais lavar os pratos”. João Bosco Bezerra Bonfim cordeliza Aninha, a menina feia da casa velha da ponte; Marina Pina conta de José J. Veiga. Marilda, Dinéia e Iris sacodem seus corpos por todos os espaços, não deixam a peteca cair – mas estimulam o revoar das pipas, fazendo voar versos pelos céus da velha Meia-Ponte do Rosário, Pirenópolis.

Alessandra Roscoe e Tino Freitas

Estavam lá também os autores de infantis, como Alessandra Roscoe, Alexandre Lobão, Clara Rosa Gomes, Elba Gomes, Léo Cunha, Maria Célia Madureira, Rosangela Rocha, Tatiana Oliveira... Ah, muita gente! Sei que omiti um montão, e dizem que isso é injusto ou mal-educado, mas fazer o quê? No meu computador tenho a lista completa. Se alguém quiser mais informação, email-me (ih! Que verbo horroroso!).
Gilbeto M. Teles autografa para Adriano Curado e Thaís Valle



Marieta Souza marcou presença com suas histórias de vida. Adriano Curado e Thaís Valle alegraram-me o coração. Matei saudade de Paulo José, repórter e poeta, companheiro de seminário em Cuiabá nos idos de 1992...







Mascarado leitor: um belo símbolo para a Flipiri...
Enquanto ouvia Elisa, poetizei. Impossível não dar vazão ao texto poético num momento como aquele! Mas esses versos, leitores queridos, ficarão para outra hora, talvez para outro espaço, páginas de um novo livro, talvez. Este ano de 2011 foi o da festa que se consolidou. Ano que vem, espero que os recursos financeiros cheguem num total capaz de fazermos melhor (incluo-me com humildade, quero ajudar e participar!). Agora, temos Valéria e Marconi Perillo interessados nesse esforço, e agora sei que poderei oferecer a Iris Borges e sua “troupe” informações capazes de propiciar o que tanto almejamos – o estreitamento de contatos dos escribas de Goiás e Brasília.

A mim, isso é razão de alegria e bem-estar. Tenho muito a aprender com eles.


* * *












Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da 
Academia Goiana de Letras.

quinta-feira, maio 19, 2011

Festa Literária de Pirenópolis – a Flipiri

Fotos por Adriano Curado, Regina  Jardim,  
Renata Pina e Luiz de Aquino




Festa Literária de Pirenópolis – a Flipiri


Luiz de Aquino com Elisa Lucinda


De repente, a cidade se veste de letras. E, obviamente, os sinais mais fortes acontecem nas escolas da cidade e dos povoados. Inúmeros escritores misturam-se aos professores de cada dia, envolvem-se de alunos – todos pequeninos – curiosos e capazes de entender o que se lê, o que se fala, o que se encena. É a Festa Literária de Pirenópolis, que, este ano, marcou sua terceira ocorrência.


Iris Borges,  escritora e curadora.
Iris Borges, poetisa e agente literária, idealizou e organiza essas feiras. É ela a curadora desse evento, bem como presidente do Instituto Casa de Autores. Gosto do modelo: a festa é das letras, dos livros como produto de ficção e poesia, é de pequenos estudantes, é dos autores. Nesta festa, a evidência fica para a relação autor-leitor-professor-estudante. Assim, o comércio de livros é exercido, sim, mas não é a ênfase, como acontece nas feiras de livros. Este meu registro tem justificativa: nas vendas de livros, os autores significam apenas 10% do custo de capa, enquanto os livreiros – fabricantes e comerciantes – equivalem aos demais 90%. Há que se considerar os encargos; mascara-se o custo dos livros com a “isenção de impostos”, mas o comércio não se mantém sem custos altos – como aluguéis (nos xópins, por exemplo, esses custos são exorbitantes) e encargos sociais nas folhas de pagamentos dos empregados, para ser sucinto.

Valéria Perillo, primeira-dama


Governador Marconi Perillo
Voltando às  letras, quero contar do bom. A III Flipiri estreou com um café da manhã na Sala Dona Gercina (Palácio das Esmeraldas), oferecido pelo casal Valéria e Marconi Perillo. As duas edições anteriores não receberam do governo estadual sequer um apoio de formalidade,  como é da práxis política, muito menos recursos materiais. Agora, com o casal pirenopolino no Governo do Estado, temos a certeza de que Pirenópolis retorna a Goiás.

Gilberto e José Mendonça Teles, irmãos e poetas.

O grupo liderado por Iris Borges é sediado no Distrito Federal, daí a forte afluência de escritores residentes na Capital da República; no ano passado, incluíram-me na programação, e coube-me convidar escritores de Goiás para o evento. O pouco tempo fez com que eu tentasse envolver os membros da Academia Goiana de Letras e uns poucos outros companheiros, e inscrevemo-nos para um painel integrado (Maria do Rosário Cassimiro, Fátima Lima, Leda Selma e Guga Valente, além de mim; e lá, envolvemos também José Mendonça Teles, Brasigóis Felício e Elder Rocha Lima).


Elder Rocha Lima e Luiz de Aquino
Este ano, por iniciativa de personalidade alheia ao trabalho de programação e ajuntamento de autores, quase fiquei de fora. Mas a delicadeza dos organizadores envolveu-me e a outros goianos, como os irmãos Gilberto e José Mendonça Teles, Elder Rocha Lima, Adriano Curado, Renata Normanha, Eliane Lage, Heitor Rosa, Ita Pereira, Lúcia Mendonça de Andrade, Marieta Sousa e muitos outros.


No programa, Café com Poesia e Café com Prosa – eventos realizados no ambiente acolhedor que foi morada do diplomata e escritor Isócrates de Oliveira, marcaram–se pelo intercâmbio feliz entre escribas moradores de Goiás e Distrito Federal. No primeiro, as apresentações pessoais e a leitura de poemas de cada um; no segundo, a alegria de ouvir a voz do contista José J. Veiga, falecido em 1999, na leitura de dois de seus maravilhosos contos. 



Ênfase para a professora Marina Pina, que discorreu sobre a personalidade do autor de Sombra de Reis Barbudos na intimidade das ruas tortas da velha cidade, das serenatas e da alegria do contista. Coube-me contar dos esforços, ao longo de oito anos, até conseguir instalar o acervo literário de José Veiga na Biblioteca Central do SESC, em Goiânia.

Além disso, vale registrar os saraus de recitação, com poetas vários. E dois momentos também elevados, como a apresentação da poetisa, cantora e atriz Elisa Lucinda e o xou de Maria Eugênia e Pádua, produzido por Cláudia Mendonça, com a banda dirigida por Luiz Chaffin.

Marilda Bezerra e João Bosco B. Bonfim 


O patrocínio foi da Petrobrás, do BNDES, da Oi, da Caixa Econômica e do Governo do Estado de Goiás. Apoio da Academia Pirenopolina de Letras, Artes e Música. O público: cinco mil alunos, de vinte e duas escolas públicas do Estado e do Município, e cerca de dez mil pessoas, visitantes e em audiência dos espetáculos, que tiveram a produção cultural de Marilda Bezerra (com o estimado apoio direto do poeta João Bosco Bezerra Bonfim).

Ah! Momento alto, também, para enfeitar uma tarde... A revoada de pipas, com a meninada ensinando poetas adultos a levitar seus poemas... Era o voo dos versos, ponteando de cores o azul límpido do céu de outono, alegrando o cenário do velho casario e das margens verdes do Rio das Almas.


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Luiz de Aquino, escritor e jornalista.




segunda-feira, maio 16, 2011

O fenômeno da burrice (do Professor Doutor José Fernandes, membro da Academia Goiana de Letras)

            O FENÔMENO DA BURRICE

                                                                        José Fernandes*

           
– Professor, já conhece a nova cartilha do MEC, “Viver, aprender”, em que os lingüistas afirmam peremptoriamente que podemos falar e escrever “Nóis pega o pexe?”, “ Os menino pega o pexe”?

– Seu Ângelo, já lhe disse que não quero mais falar e, muito menos, escrever sobre os problemas da Língua Portuguesa, pois o nível do ensino anda tão precário que falam e escrevem sobre tudo, sem se ter a base, o alicerce do conhecimento! Pelo amor de Deus, me poupe desse assunto! Estou aposentado, sou cardíaco e não posso me estressar!   

– Infelizmente, não posso poupá-lo! Não podemos passar à história, coniventes com a burrice e com a demagogia, que criam preconceitos e problemas de convivência social existentes apenas nas cabeças de pessoas pequenas que iniciam o prédio pelo teto! Você já mostrou este problema muito bem naquela crônica sobre Monteiro Lobato; mas elas não se contentam apenas em condenar o passado, querem recriar o presente como se história começasse com elas. Se a escola existe para confirmar a linguagem falada que se aprende em casa, para que escola, para quem, ensino? Não é sem motivo que o filosofo francês George Gusdorf disse que a desgraça do ensino é a proliferação de pedagogos e, podemos acrescentar, a proliferação de lingüistas que não sabem escrever e querem ditar normas lingüísticas e, além do mais, criam preconceito; agora, lingüístico. Não é uma piada?

– Já lhe disse que não quero me manifestar. De qualquer modo, uma vez que deseja discutir assunto tão perigoso, quem são os preconceituosos; os que escrevem e falam corretamente, ou os que se utilizam da língua popular e não sabem escrever?

– Hoje, você está inflexível! Como os preconceitos, segundo os preconceituosos, são sempre contra as minorias, ele advém dos que falam errado e não sabem escrever. É a lógica! Se bem que a maioria dos preconceitos está passando por um processo de reversão, pois as chamadas minorias estão se tornando maioria, como os parcos intelectuais que reprovam o analfabetismo funcional, como o daqueles dois que acusaram Lobato de racista e de eugenista, por exemplo! Os perseguidos são aqueles que sabem as causas, como você. E estes são extrema minoria! Você não acha?

– Não acho nada! Depois, se achar ou deixar de achar, pouco vai resolver, porque além de pequenos no sentido ôntico e, também, no ontológico, lingüistas e pedagogos sofrem de gogo. Não viu aquela professora imbecil que desejava saber a opção sexual de um menino de onze anos? Será que ela estava interessada no menino? Será que ela é apenas burra, ou apenas preconceituosa?

– Finalmente o senhor falou alguma coisa! Mas, isso é bom para o MEC verificar a quantas anda o ensino neste país, se é que vê? Na verdade, não vê! Se visse não aprovaria uma cartinha que contraria um instrumento que não apenas afirma a cidadania do individuo; mas que, sobretudo, manifesta o seu estado de ente ou de ser. Mas, como a maioria é ente e sequer sabe o que é ser, não apenas no MEC; mas em toda sociedade carnaval desse país carnaval, pensa apenas em cidadania, cria apenas preconceitos infundados!

– Se os “sábios” de tamanco alto não sabem a diferença entre ente e ser, jamais entenderão que a língua é um componente metafísico que confere identidade ao cidadão. Sempre verão o conceito de cidadania no rodapé da semântica e, pior, sempre o verão sob a ótica da demagogia barata, centrada em ideologias pernilongas. Nossa Senhora! Disse que não queria falar e estou falando. O senhor é terrível, seu Ângelo!

– Professor, se não nos manifestarmos, o futuro nos condenará a mudez, quando ainda podíamos falar. A manifestação através da linguagem não se configura matéria e essência de liberdade? Só somos livres, se pudermos falar! Se formos obrigados a dizer só o que o poder ou aqueles a ele ligados, deseja ouvir, não existe liberdade. Mas, só é livre quem pensa e sabe falar, porque o que se pensa só é pensado em linguagem. A manutenção do cidadão na ignorância lingüística é uma forma de mantê-lo dominado; é uma maneira de mantê-lo em estado de ente, pouco diverso dos animais, porque ignorante de seus direitos e deveres.

– Assim, o senhor não se aproxima das massas, seu Ângelo! Segundo a nova cartilha, o correto é dizer “inguinhorante”!

– Você fala pouco! Chamo-o de você, pois sou trinta anos mais velho e, portanto, possuo a imunidade conferida pelos ontens!

– O senhor está dando o pé para os lingüistas e pedagogos, mandões do MEC, lhe pegarem! Onde já se viu usar um advérbio no plural!

– Você tem razão! Eles jamais vão perceber que este plural transforma a frase seca e referencial em frase poética! Mas, como eles não sabem nem o que é poesia, para que me preocupar! Eles só pensam em preconceitos! Como os poetas, somos poucos, nós é que somos discriminados! Veni Creator Spiritus, mentes pedagogón et linguosorum visita!

– Ainda bem que o Espírito Santo sabe latim e grego, pois como as duas palavras pedem genitivo plural, nos dois idiomas, o senhor as utilizou corretamente! Parabéns! Garanto-lhe que lingüistas e pedagogos do MEC, metidos em língua portuguesa, uma língua neolatina que possui inúmeros vocábulos oriundos do grego, não as sabem! Nem escrever em português, eles sabem! Logo, teremos de importar professores de Língua Portuguesa da lusitana pátria de Camões e Fernando Pessoa! É o fim! Miserere nobis, Domine!




* José Fernandes é membro da Academia Goiana de Letras. thjfernandes@uol.com.br  - thjfernandes@gmail.com

* * *

Minha resposta ao Mestre:







Gente humilde tem direito 
de aprender o certo!


A propósito do meu texto em apoio a crônica do acadêmico José Fernandes, um libelo contra o livro que tenta legitimar a fala e a escrita incorretas, recebi, via Facebook, essa “pérola”, de pessoa que, imediatamente antes, pedia para ser “amigo”; mas ele queria apenas alfinetar-me, nos termos seguintes, sem qualquer retoque de minha parte:

“Caro Luiz quando você critica o livro de português que tem variações de conjunções verbais, mostra que estais longe de ser um professor, perto de seu alunos. sua avaliação e preconceituosa e distante da realidade”. (Amigos da revisão, deixem tudo como está, ou minha resposta perde o sentido).

Respondi, direto e franco:
“De jeito nenhum, Sr. Francisco! Sou usuário contumaz da linguagem coloquial em meus textos de crônicas e poemas. Só não aceito essa suposta facilidade: legitimar a escrita errada é negar a quem mais precisa o acesso à língua culta. Rejeitá-la, sim, é preconceituoso. Todos temos direito de compreender a escrita correta e a ninguém é dado o direito de substituir a Língua Portuguesa por um dialeto tosco como "nóis pega o pexe". Note, porém, que qualquer de nós, escritores, usa essa grafia na voz de personagens. Mas evoco o saudoso Carmo Bernardes, a quem chamava de "o matuto erudito", pois foi ele quem mais registrou o linguajar do roceiro sem, contudo, cometer erros de português, entende? Portanto, antes de me condenar sem julgamento, informe-se melhor, por favor. Gosto, por exemplo, das combinações de tu e você, como "Você é linda, eu te amo"; mas usar a segunda pessoa do plural, como você fez linhas acima, é sinal de pedantismo. E pedantismo é pior que preconceito, já que preconceito denota ignorância (pré = antes; conceito = juízo). E, novamente por favor, não se ofenda: você me acusou de estar longe de ser um professor - e estou mesmo, ainda que formado para tal; áulicos da ditadura afastaram-me do ensino por causas menores que a sua acusação vil formulada agora. Se você se dá ao direito de assim me julgar, dá-me também a permissão de responder-lhe como melhor me convém, em defesa própria”.

Esse Sr. Francisco deve ter recebido alguma luz libertária sem saber, contudo, de onde vinha o foco. Mistura, como é da praxe nos últimos trinta anos, o desejo de liberdade com a facilidade de não se comprometer. Quer ter todos os direitos, sem arcar com a obrigação mínima de retribuir à sociedade, aprendendo algo nos anos em que pôde cursar escolas.

Note que o Ministério da Educação, tentando mascarar o grave erro de fazer permanecer o livro equivocado (não citarei seu título nem autora) tentou lavar as mãos, alegando que continuará exigente no ENEM e nos vestibulares – ou seja, o estudante que acreditar naquilo de que falar e escrever errado é válido, estará condenado às trevas da ignorância; virá a constituir a massa ignara do subemprego, dos biscates possíveis, da marginalidade, enfim! Escolas existem para permitir o desenvolvimento do cidadão. Para evitar, certamente, que ele, ainda que com titulações pomposas, venha a escrever “Você estais”, como se viu na interpelação com que fui atropelado.

Vale a pena ler a entrvista do acadêmico da ABL Evanildo Bechara: 
 http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/o+aluno+nao+vai+para+a+escola+para+aprender+nos+pega+o+peixe/n1596951472448.html.

Lembrei-me de uma moça simplória, em Caldas Novas de 1955 – eu tinha menos de dez anos e minha escolaridade era a das três primeiras séries. E eu já estranhava o modo como ela dizia, solene:

– Mais amor, menas confiança!

* * *

Luiz de Aquino, escritor e jornalista