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sábado, junho 02, 2012

Os de Caldas Novas


Os de Caldas Novas
Caldas Novas, década de 1950.

A saudade me visita outra vez.... E aí, corro à memória - a minha - e esta sugere-me a informática; fuço no computador e encontro esta crônica, de fevereiro de 2004. Republico-a porque estou seguro de que grande parte dos atuais leitores dos meus escritos não a conhece e, assim, mostro-lhes um antigo que pode ter ar de novo, enquanto ofereço aos antigos visitantes dos meus textos a mesma ocasião que me assola - esta de reviver a saudade. 



* * *

Caldas; ou Caldas Novas. Daí o gentílico “caldense” – que vale para qualquer outra cidade que tenha a palavra “caldas” em seu topônimo – e o corretíssimo “caldas-novense”, que eu prefiro porque nos difere dos das demais. Éramos muito pouca gente, os de Caldas Novas daqueles anos de 40, 50 ou 60 do século passado. E tínhamos lá um Heráclito, sobrenome Ala – família exclusivamente caldas-novense. Heráclito, filósofo grego nascido em Éfeso, foi quem ensinou à humanidade que tempo e lugar mudam sempre, e muda o rio, e mudam as pessoas...

Falo agora de uma Caldas Novas bem heracliana (ou seria heracliteana? Deixo isso por conta dos filólogos), a minha cidade de infância, a que não mais existe porque não mais é a mesma. Do velho centrinho (como dizem lá), restou o traçado urbano de José Teófilo de Godói, poeta e engenheiro; e o desenho do jardim da pracinha que hoje tem o nome do Mestre Orlando Rodrigues da Cunha. De tudo o mais, nada resta, porque as solenes e vetustas casas cederam suas fachadas para o ofício do comércio que explora os turistas.

Os meninos espalhavam-se aos onze anos, era hora de ir para os colégios; nas férias, reencontravam-se e, ano a ano, as coisas mudavam um pouco mais. Banho quente na natureza, frutas saudáveis em frondosas árvores de quintais – jabuticaba, manga e caju; depois, pamonha porque era verão. E aí chegou o tempo de se estar em Goiânia, mas já não éramos mais os meninos interioranos, e sim rapazes com trejeitos urbanos.
    
Casamo-nos, quase todos; separamo-nos, muitos de nós. Alguns recasamos, outros sumiram por aí. Mas a lembrança e a saudade, irmãs gêmeas quase que perfeitas, estalam do fundo da memória e beliscam nossas emoções. Isto se dá sempre que a gente se reencontra.
     
Quase ninguém entende o fato de eu não me sentir ligado à atual Caldas Novas. Ó, gente! Isso é muito fácil de explicar e a essência está muito longe no tempo (em poucos casos um advérbio se presta a exprimir espaço ou tempo; “longe” vale para as duas situações, mas “onde” é exclusivo de espaço, embora muitos jornalistas, acadêmicos e políticos insistam em usá-lo como advérbio de tempo). A definição foi dita por ele, Heráclito, seis séculos antes de Cristo.


É isso o que acontece com a terra em que nasci; preciso lembrar Bilac “Criança! Não verás país nenhum como este!” e Drummond – “Itabira é apenas um retrato na parede / mas como dói!”. Dói lembrar as ruas de cascalho avermelhado, os dois bares, as duas farmácias, os dois açougues – porque udenista não comprava em estabelecimento de pessedista, e vice-versa a única igreja, a única quase solidão...


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Primeiros anos da década de 1960.

3 comentários:

Mara Narciso disse...

Andava preocupada com o seu silêncio, Luiz. Mudanças traçam novos horizontes e logo estará com novidades. Minha irmã Carla hoje mora em Poços de Caldas, no sul de Minas. O gentílico seria poços-caldenses? Onde, como advérbio de tempo, cheira normal. O "a qual" ou "cuja" ficam estranho. Vejo que misturei tudo...risos..Preciso aprender muito. Sou esforçada, mas coisas do hífen não entram na minha cabeça, por mais que eu leia.

moraes disse...

Lindo texto, parabéns. Sou um daqueles que se espalhavam aos onze anos!!!!

Marlene Pires Araújo disse...

"Tocante sua crônica. Embora não tenha nascido aqui e nem vivido estes tempos de Outrora aos quais você cita . Fez me viajar no tempo e imaginar o quão bom era essa época. Mas ainda consegui viver um pouco do que restou desse tempo. Me mudei para cá no primeiro ano da década de 80 , ainda menina , com 10 anos de idade, juntamente com meu pai e minhas 2 irmãs ( minha mãe já era falecida ) . E era uma Caldas Novas pitoresca, com poucos bairros ( talvez 6 ou 7 ) Todos se conheciam e se encontravam nas poucas ruas existentes , na igreja e na nossa querida praça. Se não me engano, éramos em torno de 10.000 habitantes. Nostalgia total . 👏👏👏"