Manhã de sonho
e esperança
Um pássaro prisioneiro, de
canto dissilábico e repetitivo, desperta-me bem cedo, quando não me pesa o
cansado de véspera ou algo me leva a dormir mais cedo. O trinado anuncia o
albor e estende-se até perto das oito horas, no circuito natural do sol –
ninguém disse à pequenina ave que a suprema autoridade da República impõe-nos
um tal horário de verão. Da minha janela, vejo a gaiola de onde vem o som: a
primeira nota, curta e una; duas outras compõem a segunda sílaba.
Gosto de ouvi-lo nas manhãs.
Curiosamente, pássaros não costumam variar seu canto, mas não há monotonia na brevíssima melodia. Lamentável é a
gaiola. Um mínimo animal que navega os céus e canta em galhos sugere sempre liberdade
– e inevitáveis metáforas. Tenho ganas de escalar o edifício em frente, invadir
a sacada do terceiro andar e abrir a pequenina porta, ofertando ao passarinho,
de volta, o destino que Deus lhe deu – o de voar livre.
Porque as pessoas aprisionam
animais? Prendem-nos e alegam um gostar – gostar estranho esse, que tolhe a
vida natural em troca de um prazer mesquinho, o de dispor de seu canto. Ora! Há
quase um século é possível gravar sons. Gente que se diz “criadora” de pássaros
comete contra eles o crime do cerceamento da liberdade... Alguns há que não
procriam em cativeiro; e há ainda os que se aprisionam individualmente,
cerceando, assim, que aquele animalzinho não se reproduza. Acho que gente assim
devia ser castrada.
Quando queremos ser livres,
falamos em voar; se queremos ser felizes, cantamos. Cantava o pássaro – não sei
que pássaro é esse, não consigo vê-lo daqui, somente a pequena jaula. Cutuquei
o Lucas, que se levantou em silêncio e assim se aprontou, tomou o café da manhã
e, sempre calado, acompanhou-me; saímos de casa sob um céu de nuvens plenas. Às
sete horas de verão, as ruas já congestionadas de carros em demanda ao
trabalho, ao médico, às escolas ou a destinos outros, tal como nós, tomamos o
rumo da Marginal Botafogo. E foi aí que a chuva caiu. Percorremos dez
quilômetros em cinquenta minutos, alcançamos a rodovia que nos leva a
Nerópolis. O trânsito trancado ficou para trás e vinte minutos após chegamos ao
Colégio Estadual Mauro Borges.
Ivone, bibliotecária; e Adriana, Coordenadora. E um livro meu... |
Foi Ivone, a bibliotecária,
quem propôs aquele Chá com Poesia. Uma poetisa da cidade, Divina Cunha, já
chegara – e nós tivemos um atraso de quinze minutos, mas este tempo estava
inserido nos preparativos. Alunos de séries fundamentais futricaram livros e a
Internet, ficaram sabendo da vida do convidado – eu mesmo –, e escolheram
poemas para ler e parafrasear, sob orientação e tutela das professoras Agda
Santos e Allyne Pimenta. Mas o melhor da festa foi a descoberta, pelos três
escritores convidados (Divina, Lucas e eu), das qualidades poéticas dos alunos,
sementes óbvias de adultos sensíveis e bem orientados, já detentores de valores
que, muitas vezes, julgamos esquecidos.
Enfim: da diretora Fernanda,
passando pela vice-diretora Ivanilda, por professores, coordenadores, pessoal
administrativo (sempre a postos para que nada falte), uma equipe excelente! Ah!
E o lanche? Um beijo à coordenadora da merenda, professora Janete! Mas muitos
beijos aos meninos estudantes, pequenos poetas, promessa de um futuro que –
Deus me permita! – quero ver melhor.
Um futuro livre, de poetas
construtores de tempos melhores, de liberdade para os povos – e os pássaros
também.
* * *
3 comentários:
Que coisa boa poder semear em lugar propício, fértil, e que será regado. Essa turma que aparece nas fotos saberá usar bem o que está sendo ensinado. Serão leitores e alguns também escritores. A foto do topo está mostrando uma alegria genuína e seu filho Lucas a cada dia se parece mais com você, Luiz. E que demore a ser saudade. Não vê Niemeyer? Cento e quatro anos e melhor, deve sair do hospital.
Queria poder, através de palavras, exprimir o que senti naquele dia. Eis um dia chuvoso, talvez o única que me deixou tanto feliz. O dia dos sonhos, o dia da esperança, o dia que talvez poucos vivenciarão em suas vidas. O dia de ver nos olhos dos outros, a verdeira e sublime felicidade!... sim... Manhã em que nosso coração não cabe tanta alegria. São poucos estes momentos, e que sejam eternizados, enfim. Nada do que fale, vai conseguir dizer o quanto sou grata por haver pessoas como vc neste mundo, que há de melhor nas pessoas. Assim, meus problemas se tornaram seus, e neste aglomerado, surgiu o Luiz, Amigo da Escola, muito mais que amigo, vc já é nosso coração...
Um poeta que naquele dia, em cada livro seu, autografou sonhos e esperanças...
Certa vez. uma pessoa que, então, era muito importante na minha vida declarou algo que me deixou a pensar muito seriamente: as pessoas nunca sabem que são felizes; sabem, sim, que foram felizes.
Desde aquela época, passei a observar muito o presente; e descobri que é possível, sim, saber quando se é feliz (não é preciso esperar o momento se tornar passado).
Aquela manhã fez com que o dia 8 de novembro de 2012, fosse um dos mais felizes da minha vida! Nunca autografei com tanto prazer e alegria! Nem mesmo na minha estreia, há décadas!
Obrigado, Allyne Pimenta! Por favor, diga isso às professoras Ivone e Agda e beije por mim todos aqueles alunos maravilhosos!
Postar um comentário